Organizações patronais, gestores e empresários congratulam-se pela existência de uma maioria parlamentar do Partido Socialista. Congratulam-se, mas deixam um pacote de exigências ao futuro governo considerando ser possível governar sozinho, o que não é verdade como todos sabemos. António Costa foi o primeiro a dar a mão à palmatória prometendo governar não como “absoluto” mas em diálogo.
O caderno reivindicativo patronal vai desde a estabilização da legislação laboral, passando pelo incentivo ao investimento e pela redução da carga fiscal. Mas o outro lado, os partidos perdedores à esquerda, não desarmam e insistem nos aumentos salariais por via administrativa, ameaçando com lutas de rua. E este é um cenário muito difícil para o PS governar.
A entrega de uma maioria absoluta que nenhum dirigente político esperava é um claro caderno de encargos dos eleitores a um partido para que este governe no sentido do progresso mas, já estamos a começar com muita “areia na engrenagem”.
Enquanto os perdedores olham para as lideranças, alguns a preparar mudanças radicais e outros a apostar na disrupção da ação e do discurso, quem fica a governar tem de preparar um país para sair da pandemia, aproveitar os recursos colocados à disposição pela União Europeia e relembrar que este Governo tem cerca de 60 mil milhões de euros para investimentos dentro dos quadros do PT2020, do PT2030 e no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência.
Mas, não esqueçamos, tem o problema de uma inflação a acelerar e que vai consumir os aumentos do Salário Mínimo Nacional, de um país com fraca produtividade, na expectativa que o turismo recupere e com custos exorbitantes com a energia, a somar ao aumento dos juros que irá sofrer dentre de meses.
Aliás, a decisão do Banco de Inglaterra de subir os juros para 0,5% com uma inflação estimada para o trimestre a ultrapassar os 7%, não é bom augúrio. Aumento este que nem sequer foi consensual, já que alguns conselheiros pretendiam uma subida maior.
Do lado do Banco Central Europeu (BCE), a pressão para subir taxas vai colocar-se em março, altura em que o banco central altera a estratégia na compra de ativos. A presidente do BCE, Christine Lagarde, afiançava “a pés juntos” que o tema inflação é passageiro e que a subida dos juros não seria assunto em 2022. Afinal, tudo começou a virar nesta quinta-feira com Lagarde a admitir que o nível de inflação média de 2% está perto do objetivo.
Importa não esquecer que as projeções do BCE, ao nível da inflação para 2023 e 2024, estão longe da realidade. E, caso esta tendência de subida prossiga, será um grande problema para as contas públicas, empresas e famílias. E no Governo estará um único partido que tem todos os “olhos” sobre si, e de quem se espera reformas na justiça, no ensino, na tributação e no trabalho para que a economia comece a crescer.
Os 4,9% de crescimento do PIB em 2021 parece muito, mas é pouco quando comparado com a quebra do ano anterior e quando comparado com outros países europeus com crescimentos de 6% a 8%, sendo que, contrariamente ao que disse o primeiro-ministro António Costa, o país nem sequer está a convergir com a União Europeia, pois a média de crescimento do PIB na UE foi superior ao crescimento nacional.
Estas são reflexões para consumo interno e não exigem ser-se um “expert” para perceber que haverá degradação do poder de compra, instabilidade laboral e – infelizmente – uma possível inversão dos números do emprego. 2022 arranca marcado por incerteza e volatilidade.