O início do debate instrutório da Operação Marquês, que estava previsto para esta quarta-feira, 4 de março, arranca hoje, depois do adiamento que se ficou a dever à necessidade de novo interrogatório a José Sócrates para esclarecer questões relativas a férias do ex-primeiro-ministro, ao projecto TGV e à internacionalização do grupo Lena. Sócrates voltou a negar as acusações e criticou novamente a atuação do Ministério Público ao afirmar que “construiu um embuste uma grande mentira”.
Em causa está o último acto da fase de instrução em que, após alegações das partes, juiz Ivo Rosa decidirá sobre a existência de indícios suficientes para submeter a julgamento, ou não, os 28 arguidos, entre os quais José Sócrates, o empresário Carlos Santos Silva e Ricardo Salgado.
No primeiro dia do debate instrutório (sessão que finaliza a fase de instrução) está previsto ser ouvida Bárbara Vara que está acusada de dois crimes de branqueamento de capitais, num dos quais estão também acusados os arguidos José Sócrates, Carlos Santos Silva, Joaquim Barroca, Armando Vara, Diogo Gaspar Ferreira e Rui Horta e Costa. Neste último caso, o Ministério Público relaciona o envolvimento de Bárbara com transferências de dinheiro com origem no holandês Van Doreen, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem de dinheiro por uma conta bancária na Suíça em nome de Joaquim Barroca. O Ministério Público sustenta que o antigo primeiro-ministro e o ex-ministro terão recebido luvas pela expansão do resort Vale do Lobo, sinalizando que cerca de dois milhões de euros passaram por uma conta offshore de Bárbara Vara e do pai.
Já Sofia Fava responde por um crime de branqueamento de capitais e outro de falsificação de documentos, em co-autoria com José Sócrates e o empresário Carlos Santos Silva. A ex-mulher de antigo primeiro-ministro assegurou, na fase de instrução, que nunca recebeu dinheiro de José Sócrates e que achava Carlos Santos Silva uma pessoa “abastada e que vivia desafogadamente”. Para Sofia Fava, o amigo de Sócrates era um bom amigo que lhe emprestou 150 mil euros para sinalizar a compra de um monte no Alentejo e a contratou para trabalhar numa das suas empresas, relação laboral que lhe valeu cinco mil euros por mês.
O antigo primeiro-ministro foi esta quarta-feira prestar novas declarações na instrução do processo Operação Marquês, depois de ter sido chamado a depor pelo juiz Ivo Rosa, que tinha programado para este dia 4 de março, o início do debate instrutório. Sócrates voltou a criticar a atuação do Ministério Público e a refutar as acusações relativas ao TGV e favorecimento aos negócios do grupo Lena.
Sócrates volta a criticar Ministério Público
Sócrates foi ouvido esta quarta-feira antes do início do debate instrutório que estava marcado para o mesmo dia 4 de março, mas levou ao adiamento do seu arranque devido à intenção a intenção de última hora do juiz Ivo Rosa de ouvir novamente o ex-primeiro-ministro. Ex-primeiro-ministro à saída do interrogatório voltou a criticar a atuação do Ministério Público: “construiu um embuste, uma grande mentira”.
“O Ministério Público disse que estive 20 e tal dias de férias no Algarve e alguém pagou as férias, que estive num fim-de-semana de férias no Algarve e depois foi-se ver e estive em Bragança e na Covilhã. Que credibilidade tem esta acusação? O Ministério Público dispensa-se de apresentar provas e acha que as pessoas é que têm de provar”, disparou José Sócrates à saída do tribunal, no Campus de Justiça, onde esteve mais de duas horas a ser ouvido pelo juiz Ivo Rosa e pelo procurador Rosa Teixeira que colocou questões relativas às férias de Sócrates no Algarve. O juiz também fez perguntas sobre o TGV. Mas Sócrates negou ter tido informação sobre o consórcio, que era, segundo o ex-primeiro-ministro, conduzido pelo Ministério das Obras Públicas. Ivo Rosa quis também saber como foi o processo de internacionalização do Grupo Lena, tendo o ex-governante negado favorecimentos a Angola e Argélia para ajudar os negócios do grupo Lena nesses países.
O debate instrutório do processo Operação Marquês estava marcado para as 14h desta quarta-feira, 4 de março, mas com a intenção de última hora de ouvir novamente José Sócrates, que já tinha sido inquirido na fase de instrução, levou a adiar para hoje o arranque desta fase processual . Em causa está o último acto da fase de instrução, no qual as partes, Ministério Público, advogados dos arguidos e assistentes, fazem alegações no sentido da confirmação ou da rejeição da acusação, tendo em conta os dados recolhidos na fase de instrução do processo Operação Marquês que conta com 28 arguidos – 19 pessoas e nove empresas – e está relacionada com a prática de mais de uma centena e meia de crimes de natureza económico-financeira.
O juiz já marcou nove sessões de debate instrutório, devendo as defesas de alguns dos arguidos invocar novamente as alegadas ilegalidades que dizem existir no processo e que já foram apresentadas ao juiz Ivo Rosa no Requerimento de Abertura de Instrução.
“Só em ditadura se escolhem juízes”, diz ex-primeiro-ministro
À chegada ao Campus de Justiça, José Sócrates prestou ontem declarações aos jornalistas para voltar a defender que a distribuição do processo Operação Marquês foi manipulada: “Só em ditadura se escolhem juízes. Quando se viola a lei, isso significa que alguma coisa não correu bem. O Dr. Juiz Carlos Alexandre foi escolhido, não foi sorteado. Tudo porque era quem mais convinha ao Ministério Público”, disse.
O ex-primeiro-ministro acrescentou ainda: “há cinco anos que me defendo desta acusação falsa, injusta e absurda. O Ministério Público tem motivações que nada têm a ver com nenhum tipo de Justiça mas sim com motivações políticas”, acrescentou.
A Operação Marquês, com mais 53 mil páginas de papel, tem como principal arguido o ex-primeiro-ministro José Sócrates. A investigação envolveu mais de duas centenas de buscas, tendo sido ouvidas mais de duas centenas de testemunhas e recolhidos dados bancários sobre 500 contas, em Portugal e no estrangeiro.
A investigação começou em 2013 com uma comunicação da Caixa Geral de Depósitos (CGD) ao Ministério Público de uma transação que terá rendido meio milhão de euros a Sócrates.
Segundo a acusação do Ministério Público, José Sócrates começou a ser corrompido quase na mesma altura em que tomou posse como primeiro-ministro, depois das eleições de 2005, estando os responsáveis do inquérito convencidos que Sócrates recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no Grupo Espírito Santos e na PT, bem como para garantir a concessão de financiamento da CGD ao empreendimento de luxo Vale do Lobo, no Algarve, e por favorecer negócios do Grupo Lena.
O dinheiro teve como origem contas de Carlos Santos Silva, amigo de infância de Sócrates e gestor do Grupo Lena. O ex-governante justifica os movimentos com “empréstimos” que pretendia pagar e que justificou com “dificuldades” financeiras.
Entre os 28 arguidos estão além de Sócrates e Carlos Santos Silva, Ricardo Salgado, Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Armando Vara, Bárbara Vara, Joaquim Barroca, Helder Bataglia, Rui Mão de Ferro e Gonçalo Ferreira, empresas do grupo Lena e a sociedade Vale do Lobo Resorts Turísticos de Luxo.
José Sócrates é acusado pelo Ministério Público de três crimes de corrupção de titular de cargo político, puníveis com penas de um a oito anos de prisão. São-lhe ainda imputados 16 crimes de branqueamento de capitais, com penas entre os seis meses e os dois anos; três crimes de fraude fiscal qualificada, cuja moldura penal vai da multa aos três anos; e ainda nove crimes de falsificação de documento, também puníveis com um máximo de três anos de prisão.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com