Com a crescente valorização da habitação enquanto ativo financeiro transacionável, no contexto de um mercado imobiliário em aquecimento nas grandes cidades e metrópoles mundiais, a habitação e o seu acesso está hoje na ordem do dia.
Em Portugal, partindo de uma tradição de forte intervenção do Estado neste setor, foi lançada em 2018 uma Nova Geração de Políticas de Habitação a qual se tem materializado através de um conjunto de instrumentos disponibilizados ao longo dos 2 últimos anos. Neste contexto foi lançado o 1.ºDireito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, e com ele o desafio da definição de uma Estratégia Local de Habitação para cada Município ou grupo de Municípios de todo o país. Centrado nas pessoas e não no alojamento, o objetivo consiste na identificação das famílias que sendo residentes nacionais e subsistindo em carência financeira, habitem em condições indignas. Prevê também a eleição e programação de soluções dentro de um leque definido- reabilitar, construir a custos controlados, adquirir e arrendar. Com recurso a 4 critérios – precariedade, insalubridade e insegurança, sobrelotação e inadequação- e à avaliação de situação de carência financeira, o programa disponibiliza apoio financeiro com comparticipações a fundo perdido relativamente interessantes, dependentes da iniciativa do setor público (Estado, Administração Local, Empresas Públicas), 3.º Setor, associações de moradores, cooperativas e mobilização dos proprietários individuais.
Já no final de 2019 foi publicada a Lei de Bases de Habitação que, embora ainda não inteiramente regulamentada, traz diversas novidades como a Carta Municipal de Habitação.
Conjugar e manejar estes instrumentos promete ser um desafio para uma Administração Local que se vê a braços com a revisão-expresso dos seus instrumentos de gestão territorial (julho de 2020), a transferência de competências e o realinhamento com um novo quadro comunitário 2030.
Pensar a habitação exige, cada vez mais, uma reflexão mais ampla que inclua as várias dimensões: bacias de emprego, serviços de proximidade, taxas de esforço das famílias, pressão turística, modos de transportes, walkability, qualidade e acesso dos espaços públicos, o valor arquitetónico e novos modos de habitar (co-living).
O momento é propício a esta reflexão, com o compromisso político assumido de inexistência de situações indignas de habitação nos 50 anos do 25 de Abril 1974, acompanhado por orçamento disponível. Restam apenas 4 anos e há tanto para fazer: definir e aprovar estratégias locais de habitação, efetivar acordos operativos, desenhar e executar projetos.
Estará o setor da construção apto a responder, com a escassez de mão de obra com que se debate? Os custos de contexto, em particular licenciamentos com novas e densas exigências legais, estarão ajustados a esta emergência?
Como responder a esta oportunidade é o desafio que se coloca às autarquias de todo o país e que estará nas mesas dos decisores nos próximos anos.