Não nos restam dúvidas, é possível superarmos a epidemia mas não nos livramos da crise económica.

Antes deste cataclismo que nos atingiu a todos, já a economia mundial abrandava. A pandemia da Covid-19 apenas colocou a economia de quarentena e a fundo o acelerador, a caminho de uma recessão sem precedentes. Estamos todos, Governo, empresas, cidadãos a tomar as medidas necessárias para contrariarmos a recessão esperada?

As medidas que o Governo anunciou, desde o lay-off simplificado no apoio ao pagamento aos salários de empresas em situação de crise, o adiamento da taxa social única nos impostos, no pagamento de empréstimos bancários e no lançamento de empréstimos com desconto, permitem a alguns setores respirar de alívio apenas temporariamente.

No entanto, a maioria vai ter de superar a crise sem auxílio numa situação única e de consequências imprevisíveis. Neste grupo contamos com os trabalhadores temporários e a recibos verdes, muitos já dispensados assim que foi decretado o estado de emergência. Esperam-se muitos mais nas semanas que se seguem, a associação do sector prevê que serão dispensadas cerca de 75 mil pessoas.

É precisamente nas empresas com trabalhadores temporários que os despedimentos mais se fazem sentir devido à Covid-19, deixando estes desempregados, os mais frágeis na cadeia laboral, com menos apoio social e menor acesso ao crédito bancário, sem soluções num país paralisado e com escassas oportunidades de emprego. Mais, os apoios apresentados para os independentes impõem o encerramento total da atividade. Se mantiverem 10% de atividade já não são elegíveis. Ora este pormenor, ao contrário do que o Governo tem afirmado, incita ao encerramento da atividade e isto não é positivo.

A legislação de protecção às rendas também atinge os senhorios que, nos próximos meses, poderão ficar impedidos de receber as rendas dos inquilinos que estejam em situação precária, como a muitos ainda lhes resta um empréstimo a ser executado pelos imóveis.

Ainda encontramos neste grupo os sócios-gerentes de microempresas, em que o dono do negócio é, simultaneamente, o único trabalhador, e que, apesar de descontarem 34,75% para a Segurança Social em troca de uma proteção social alargada, não estão enquadrados no apoio do lay-off e não poderão requerer o subsídio de desemprego. A menos que tenham contrato de trabalho formalizado e descontem para a Segurança Social como trabalhadores, os sócios-gerentes são isso mesmo, sócios-gerentes, e não trabalhadores, estando por esse motivo fora do apoio que garante o pagamento de parte da remuneração.

Numa sociedade em que grande parte da força laboral e económica reside nas microempresas e nos trabalhadores precários e a recibos verdes, as medidas apresentadas são claramente insuficientes. Urge apresentar medidas de proteção mais abrangentes.