É provável que já tenha ouvido falar dos diretos noturnos no Instagram do Bruno Nogueira, que ganharam o nome “Como é que o Bicho Mexe?”. Têm sido a sensação da quarentena portuguesa. Bruno Nogueira começa por contar o seu dia, como se estivesse instalado num divã de terapeuta, e dá largas às suas emoções numa linguagem muito colorida mas sempre vinda do coração.
Não há um guião muito detalhado, a sua experiência como humorista e entertainer guia a audiência ao longo de duas horas em que convida amigos de todas as áreas, atores, músicos, influencers, humoristas, desportistas ou apresentadores. Não há quaisquer obrigações de maquilhagem ou indumentária e as únicas luzes da ribalta são os candeeiros domésticos (uns melhores que outros) que iluminam os rostos um pouco cansados e sonolentos.
O que começou como uma espécie de catarse no decurso de uma pandemia, com uma audiência de cerca de 12 mil espetadores, rapidamente se transformou num fenómeno de popularidade, mantendo uma audiência de cerca de 60 a 70 mil espetadores (o pico terá sido 80 mil), tornando-se uma proeza que consegue rivalizar, e até mesmo superar, o que tem sido feito noutros países.
Nunca resultaria na televisão e parte do seu encanto é viver o momento presente, pois tanto assumem personagens improvisadas dignas de uma telenovela, como pregam constantes partidas uns aos outros, num bullying amistoso que cativa.
Há momentos que certamente serão recordados muito tempo depois do fim do direto. Como aquele em que um radialista solitário no arquipélago de Svalbard, no Polo Norte, de nome Cal Lockwood, é adotado por milhares de portugueses, graças ao Nuno Markl, estabelecendo-se uma inesperada ligação através da música com essa distante e misteriosa personagem. Ou aquele em que a pianista Maria João Pires entra inesperadamente no direto para tocar alguns minutos de Debussy.
Ou quando rimos até às lágrimas sempre que o Bruno Nogueira e o Nuno Lopes fazem o unboxing do pipi ou assistimos às performances (arrojadas) de Albano Jerónimo e muitos outros. Visto de fora, tudo é absurdo e o único fio condutor é o quão divertidos todos eles conseguem ser.
A emissão termina todas as noites ao som do piano de Filipe Melo, com um repertório de luxo que vai da música clássica ao jazz, o final perfeito para mais uma noite de isolamento em que tentamos manter intacta a nossa sanidade mental.
Muito se fala de como este tipo de conteúdos interativos tem vindo a alterar a forma como consumimos entretenimento, mas estes diretos têm a particularidade de ser irrepetíveis e só podem ser devidamente apreciados em direto. E faz todo o sentido que assim seja no caso de “Como é que o Bicho Mexe?”.
Bruno Nogueira já começou a preparar a sua audiência para o iminente fim do direto. À medida que se aproxima o fim do estado de emergência, começamos a recuperar as nossas vidas, de regresso a uma nova e estranha ‘normalidade’. Recordaremos com saudades as noites de quarentena, o nonsense dos diretos e o sorriso do Bruno Nogueira ao despedir-se da audiência com as palavras que, por breves instantes, nos recordam da seriedade do momento coletivo que vivemos: “vai correr tudo bem, malta, vai correr tudo bem”.