A educação é uma das “coisas” mais importantes da vida. Chamo-lhe “coisa” porque pode assumir várias definições. Dependendo da pessoa, pode ser uma qualificação, uma experiência, um requisito para algo maior, um privilégio, uma obrigação, um direito, entre outras definições. Tal “coisa” afeta a maioria das gerações mais jovens e continuará a fazê-lo no futuro. Dada a sua importância, a educação teve que se adaptar à pandemia atual.
Muitos países, incluindo Portugal, viram a necessidade de levar a educação para o formato digital para mantê-la em funcionamento. É aqui que entra o e-learning, um termo que já existe há algum tempo, mas que só recentemente recebeu muita atenção.
Antes da Covid-19, o e-learning era usado principalmente por empresas que ofereciam cursos digitais, como a Google, Udemy, Coursera, edX, etc. A principal diferença entre esses cursos e a educação de hoje é o consumidor. Enquanto os cursos online são para pessoas interessadas, que sabem no que se meteram e reúnem as condições necessárias para realizá-los (seja dinheiro, computador, condições de vida, etc.), a educação de hoje atinge todos, desde os mais pobres aos mais ricos, tem uma maior duração e é muito mais exigente para o aluno.
O e-learning tem muitos pré-requisitos, alguns mais importantes do que outros, mas cada um deles afeta o desempenho académico do aluno. Quando pensamos sobre as condições que devem ser satisfeitas, pensamos principalmente (senão exclusivamente) na ligação à Internet e no acesso a um computador. No entanto, uma vez que o aluno não está a frequentar as instalações da escola, os pré-requisitos previamente satisfeitos já não se encontram em vigor. Como, por exemplo, uma refeição saudável diariamente, acesso à biblioteca da escola, segurança, locais de estudo, socialização com colegas, presença física de professores e muitos outros.
Um estudo recente mediu o impacto da velocidade da Internet no desempenho dos alunos. Usando dados da Inglaterra de 2005 a 2008, os autores concluíram que alunos de 14 anos tinham uma melhor classificação de 1,37 percentis por cada 1 Mbit/s adicional de banda larga. Isto levanta a questão: poderemos inferir que os alunos com maior velocidade de Internet têm uma vantagem, ou, se os alunos já com dificuldades, verão as suas desvantagens agravar-se por causa da velocidade da sua banda larga?
Investigadores da Universidade de Munique estudaram a desigualdade educacional na Alemanha, perguntando aos pais sobre os hábitos dos seus filhos durante o período de confinamento. Chegaram à conclusão de que os alunos com alto desempenho reduzem o seu tempo de aprendizagem em 3,7 horas, enquanto os alunos com baixo desempenho reduzem em 4,1 horas. Uma possível explicação para estes resultados é que, para a compreensão do conteúdo académico, é necessária autorregulação na aprendizagem, característica que falta a muitos alunos com baixo aproveitamento devido às variáveis previamente mencionadas.
Ultimamente, tem-se falado muito sobre a desigualdade que o e-learning traz para os sistemas educacionais. Como muitos esperavam, os que ficaram por baixo são os alunos com baixo desempenho e aqueles com múltiplas dificuldades (especialmente financeiras), o que é plausível, uma vez que, muitas vezes, essas condições estão correlacionadas. Muitos investigadores chegaram à conclusão de que, em média, os alunos perdem parte do ano letivo devido ao e-learning, e essas perdas são maiores em lares com menor escolaridade, outra variável intimamente relacionada com o baixo rendimento e outros problemas domésticos.
Dito isto, falta-nos entender o estado de Portugal no que toca a estas variáveis importantes, e encontrar soluções para fazer combater estes problemas. Neste sentido, recomendo vivamente a leitura do recente relatório “Crianças em Portugal e ensino a distância: um retrato”, elaborado por uma equipa de investigadores da Nova SBE.
No relatório, a equipa chama a atenção para os principais problemas que Portugal enfrenta na educação, como, por exemplo, um quarto dos jovens de 12 anos “vivem numa casa em que o telhado deixa passar água, as paredes, fundações e chão são húmidos e os caixilhos das janelas ou chão estão apodrecidos”. Além disso, o relatório também mostra problemas como a desigualdade no desempenho académico através dos testes PISA, quantos alunos não têm acesso a refeições saudáveis diárias, a importância do desempenho académico do lado materno, entre outros.
Caso o leitor esteja interessado, e deseje saber mais, poderá assistir ao debate do Economia Viva, um círculo de conferências organizado para divulgar diversos tópicos na economia, tendo vários debates ao longo de uma semana, onde o tema “Educação na era digital” foi discutido entre vários profissionais da área a 6 de abril de 2021. Esta conferência está disponível nas redes sociais e pode ser encontrada aqui.
O artigo exposto resulta da parceria entre o Jornal Económico e o Nova Economics Club, o grupo de estudantes de Economia da Nova School of Business and Economics.