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Recuperação da economia vai passar pela dívida ‘verde’

Pandemia não refreou interesse pelas “finanças verdes” e a saída da crise poderá mesmo passar por aqui. Emissão de dívida alemã será decisiva.
16 Agosto 2020, 09h30

A Alemanha vai emitir as primeiras obrigações soberanas verdes em setembro e já estipulou como objetivo arrecadar entre oito a 12 mil milhões de euros este ano com a emissão deste tipo de títulos. A decisão do governo alemão é mais uma das faces visíveis em como as finanças verdes entraram definitivamente no léxico dos mercados financeiros, numa tendência que a recuperação da crise provocada pela pandemia deverá acelerar.

“A pandemia não afetou as ‘finanças verdes’ neste momento, mas podemos esperar que isso aconteça no futuro. Os países europeus responderam fortemente à crise, deixando claro que os investimentos públicos serão feitos, na modalidade New Deal, para repor o crescimento na Europa. E esses investimentos serão parcialmente direcionados a investimentos ligados ao meio ambiente”, diz Julien Bras, Portfolio Manager do Allianz Green Bond Fund, que pertence à Allianz GI, ao Jornal Económico. O especialista considera provável que a pandemia seja positiva para as “finanças verdes”, porque irá mobilizar “investimentos públicos para investimentos verdes, mas também porque irá incentivar os atores privados a investir mais em projetos/atividades alinhados com a economia verde”.

A opinião é partilhada pela área de sustentabilidade da Schroders que, ao Jornal Económico, sublinha que a pandemia levou decisores políticos, empresas e investidores a pensar mais sobre as prioridades a longo prazo, incluindo no ‘amanhã’ para as gerações futuras. “Após uma pausa inicial, vimos vários novos títulos verdes a chegar ao mercado. Na Europa da Generali, Tennet, Prologis, nos EUA da Xylem e, na Ásia, grandes bancos e imobiliárias estão a trazer títulos verdes bem documentados. Isso está a acontecer ao mesmo tempo que as instituições financeiras e não financeiras também emitiram títulos sociais e pandémicos. As empresas tentaram igualmente comunicar as suas prioridades verdes e sociais com maior clareza”, exemplifica a gestora de ativos.

A tendência já mexia com os mercados financeiros, mas na Europa ganhou um outro fôlego com a tónica que o plano de recuperação da Comissão Europeia coloca na sustentabilidade. “Os desenvolvimentos dos reguladores que refletem os objetivos climáticos da Europa aceleraram claramente nos últimos dois anos, após a Comissão Europeia publicar o seu ambicioso plano de ação sobre o financiamento do crescimento sustentável em março de 2018. O acordo verde europeu, apresentado pela Comissão Europeia em dezembro de 2019, sublinha a plena consciência da UE dos desafios climáticos e ambientais ainda próximos”, salienta Maureen Schuller, head of covered bond strategy and financials research do ING, numa nota de research.

Nesta estratégia, a emissão de dívida verde pelos soberanos pode ganhar peso acrescido. A emissão que o governo alemão pretende fazer em setembro deste tipo de dívida prevê uma maturidade de 10 anos, num paralelo com as típicas emissões de títulos de dívida das obrigações alemãs a 10 anos tradicionais. Com a crise provocada pela pandemia, o motor da economia europeia irá aumentar o financiamento nos mercados e prevê fazer uma segunda emissão deste género no quarto trimestre do ano, com o objetivo de financiar projetos verdes sustentáveis ou relacionados com a proteção do ambiente.

Para Julien Bras, da Allianz GI, a emissão de dívida verde soberana não representa diferenças, quer em termos de rendimento, quer em termos de risco, face a dívida padrão.

“Na Europa, os países comprometeram-se a reduzir as emissões de carbono na próxima década, por isso os governos verdes certamente que irão ajudar a financiar a agenda e a ser mais transparentes para os investidores. Os fundos de pensões e Tesouro também darão as boas-vindas aos ativos verdes livres de risco”, sublinha a área de sustentabilidade da Schroders.

A gestora de ativos considera que o Green Deal não só casa, como acelera esta tendência, uma vez que é um acordo “ambicioso”, com “consequências significativas na vida real”, que permite criar as infraestruturas e os incentivos necessários para uma transição para um futuro verde sustentável. “Os investidores privados dão as boas-vindas às oportunidades de investimento que virão até mesmo de setores da velha economia, como fabricantes de veículos elétricos, ou da nova economia, como redes inteligentes e banca sustentável”, acrescenta.

É neste sentido que também Julien Bras defende que o Green Deal da União Europeia “é claramente uma forma de vincular o financiamento público e privado, com o objetivo de ter impactos ambientais cada vez mais positivos (seja no setor de energia, da construção, seja no setor agrícola, etc.) e todos os compromissos assumidos no contexto do lidar em termos de valores dedicados a todos esses tópicos, irá ajudar”.

“Definitivamente, os investidores têm apetite por esse tipo de dívida. Seja do lado institucional, seja do lado do retalho, vemos um interesse crescente, e até mesmo exponencialmente crescente, por fundos voltados para investimentos que além de gerarem retorno, também visam um objetivo não financeiro, como um resultado ambiental ou social positivo”, reforça o especialista.

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