Chegado, faz tempo, de São Tomé e Príncipe, trazia colado ao corpo o cheiro a café e a cacau da época. E os meus olhos já morrem de saudades de tanto mar bom, do tamanho do céu e do verde que brota da terra em qualquer lugar que terra haja.

João de Santarém e Pêro Escobar não viram vivalma quando aqui lançaram âncora, nem porventura tiveram notícia que o achado se transformou depois num entreposto de escravos. Talvez tenham deixado pegadas nas areias de todas as praias, mas nunca vieram a saber o que leve-leve quer dizer. Ali é a vida que nos passeia pela mão à descoberta do paraíso perdido no meio do Golfo da Guiné, mesmo em cima da linha do equador.

Aos navegadores de quinhentos, hoje transformados em serenas estátuas de pedra, já é impossível explicar que por aqui andam agora apóstolos do descanso.

A caminho do Norte tento enlaçar só para mim a vista da Baía de Ana Chaves e da Lagoa Azul. Até chegar a Neves ou mesmo a Santa Catarina, onde os pescadores se fazem às ondas em escavados troncos de árvores a que chamam canoas. Na rota do Sul os meus passos percorrem o bairro do Pantufo, a vila de Angolares até Porto Alegre com a Praia Piscina, onde os cajueiros deitados se espreguiçam em areias finas.

Deposito cuidadosamente na retina da minha memória, lugar secreto onde guardo raridades, os edifícios em puro estilo colonial das Roças de Água Izé, São João, Bombaim e Monte Café. E outras preciosidades, como a cara daquele menino a empurrar um carrinho feito de lata velha e arame, como se fosse senhor do mundo e tudo tivesse, apesar de nada ter. A isto se chama felicidade e eu concordo.

São Tomé lembra-me o grande jardim das brincadeiras de quando eu também era criança. Deveria ser decretado, e passar a obrigatório, plantar um jardim nos sonhos espantados da nossa infância. E fica-me a faltar o Príncipe – encomenda para próximo escrito. E também, é claro, o “Pardal do Norte” que só foi avistado duas vezes, lá pelos anos idos de 1888 e 1991.

Chegado, faz tanto tempo, da República Democrática de São Tomé e Príncipe, mantenho a convicção que Portugal devia ter olhos de ver para este gigante porta-aviões estacionado no Golfo da Guiné, na costa equatorial ocidental de África. A 250 km do Gabão. Porque há quem chame a isso visão estratégica – se ainda formos a tempo.