O estudo do comportamento do consumidor é dos exercícios mais apaixonantes que tenho feito ao longo da minha carreira profissional. Não vale a pena teorizar em torno da atividade das Instituições sem conhecer aprofundadamente o comportamento deste importante público externo, afinal a razão de ser do nosso trabalho diário. E, mais do que caracterizar o fenómeno, é importante refletir sobre as tendências, de modo a antecipar ajustamentos ao modelo de negócio.
Os mercados de produtos e serviços financeiros de retalho têm evoluído de forma significativa, e há um padrão de tendência que se vem revelando incontornável: quer a regulação em matérias que visam garantir a estabilidade financeira, quer a legislação que tem por princípio a proteção dos direitos dos consumidores (e que assumem o lado do consumidor como a parte mais frágil da relação contratual), têm contribuído muito ativamente para a padronização da oferta.
Por terem de obedecer a um espectro de regulação de grande amplitude, os serviços financeiros de retalho têm caminhado para a “comoditização”. O mesmo é dizer que um serviço financeiro é visto tendencialmente pelas entidades como uma unidade-padrão racionalizada, e cujo fator de diferenciação tende a ser um: o preço.
Chan Kim, que tive o prazer de conhecer pessoalmente, é professor de estratégia do INSEAD, e autor do livro “Blue Ocean Strategy”. Kim sustenta, na sua obra, que os profissionais da gestão devem gerir os seus negócios, não apenas numa perspetiva de aprofundar a oferta ou melhorar as suas condições para os seus Clientes, procurando fatores de diferenciação face aos seus concorrentes.
Diz o professor que esse comportamento é característico de um negócio que se move no “red ocean” (o oceano vermelho). O marketplace em que os atores se digladiam concorrendo por uma fatia de um valor que não cresce, pelos mesmos Clientes, em que todo o trabalho é canalizado numa lógica de soma nula, altamente normativo, racional e pouco ou nada criativo.
“Tem de ousar sair do oceano vermelho e mover-se para o oceano azul. O oceano vermelho é abundante em sangue de luta pelo mesmo bolo. E o sangue atrai tubarões. Tem de procurar o seu oceano azul, e mover-se para lá rapidamente”, dizia-me Chan Kim.
Entenda-se o “oceano azul” de Kim, não como a procura de fatores de diferenciação na lógica de desenvolvimento da atividade do mesmo negócio, com os mesmos Clientes.
É, mais do que isso, aprofundar significativamente a nossa capacidade de estudo das necessidades dos consumidores, dos seus comportamentos perante a compra, e a sua atitude sobre a vida e o que o rodeia. De modo a reinventar o nosso negócio. Utilizando as forças que adquirimos, a tecnologia que está à nossa disposição, a informação, os dados, desafiando-nos para chegarmos a um mar de oportunidades em que sejamos os primeiros a instalar-nos, e tirar partido do “prémio da inovação”.
O mercado financeiro de retalho precisa disso. Precisa de aproveitar a pandemia que vivemos, e quiçá o confinamento a que estamos sujeitos, parando para pensar. Para refletir sobre o caminho que percorremos e até onde nos levará. Tenho esperança da existência de outros caminhos que nos abram perspetivas de geração de valor.
Certamente que sim. Conhecemos os mercados onde operamos melhor do que ninguém. Os nossos Clientes, os nossos stakeholders e a nossa história. De certeza que sobram fatores distintivos que possam ser incorporados nessa reinvenção e valorizados pelos nossos públicos fugindo à lógica dos padrões, da racionalização. Fugindo ao “oceano vermelho”. Porque os consumidores são muito mais emocionais do que racionais. E isso tem um valor inesgotável.