O mais recente estudo acerca da literacia financeira divulgado esta semana pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), dá-nos a conhecer dados preocupantes acerca do investidor português. De facto, constata-se que muitos dos conceitos que iremos utilizar ao longo da nossa vida são desconhecidos, como o efeito de capitalização, a inflação, o poder de compra ou até a Euribor, que é a taxa de referência nos empréstimos à habitação.

O perfil conservador do investidor português decorre, por um lado, das más experiências no mercado de capitais português e, por outro, da forma como o capital é visto em Portugal, quase como um ‘pecado’. Com efeito, ter dinheiro, ou ser rico, é frequentemente associado a negócios ilícitos ou é visto como o resultado do que se roubou a terceiros, e não ao trabalho, dedicação, ideias, empenho e visão de empresários e investidores.

No estudo apresentado pela CMVM, uma das questões tinha a ver com o que faria se recebesse cem mil euros. Cerca de 45% dos inquiridos aplicaria o seu dinheiro em depósitos à ordem ou a prazo. Ora, esta resposta não deixa de ser surpreendente quando estamos perante um ambiente de taxas zero, em que os depósitos a prazo não apresentam qualquer tipo de rendimento.

Quando não existe perspectiva de rentabilidade nos próximos cinco anos, isso significa que 45% dos inquiridos ou desconhecem o efeito da inflação, ou preferem perder cerca de 2% ao ano em inflação, do que assumir algum tipo de decisão relativamente a uma aplicação com maior risco.

E aqui chegamos a um dos problemas do investidor – decidir sem sentimento de culpa. Não é fácil tomar decisões e, por isso, há que dedicar algum tempo a aprender a investir e como queremos alcançar a independência financeira, que passa sempre por assumir mais risco.

Por essa razão, talvez muitas pessoas confiem na opinião de um amigo ou do seu gestor de conta para tomar decisões, terceirizando assim uma decisão que terá influência na sua vida, mas que, no caso de não correr bem, poderá apontar o dedo a terceiros.

O estudo também aborda a diferença dos géneros. Os homens, mais interessados no investimento do que as mulheres, e entende-se porquê. As mulheres, mais protectoras e com maior sentido de visão de longo prazo, pensam mais na família, na segurança, e por isso é natural que fiquem mais apreensivas quanto à ‘gamificação’ que existe actualmente e que funciona como um pólo magnético para os seus maridos/companheiros.

Na realidade, ambos os perfis de risco se complementam desde que exista um diálogo quanto ao investimento. Um perfil mais agressivo deve coexistir com um perfil mais conservador. O sucesso a longo prazo reside precisamente aí – no diálogo e na alteração das estratégias, até porque é importante ajustar os investimentos.

Este estudo deve, assim, servir de alerta para que se adoptem, nas escolas, acções pedagógicas ou disciplinas de gestão financeira, a fim de introduzir, desde a escola primária, os conceitos que nos irão  acompanhar durante toda a vida – decidir tendo em conta  o custo de oportunidade. Só assim poderemos dinamizar o mercado de capitais e preparar a recuperação sustentada da economia.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.