Encontramos hoje um largo consenso relativamente ao reconhecimento da elevada complexidade organizacional, profissional e tecnológica do setor da saúde aliada à identificação de múltiplos atores e stakeholders. A saúde é, sem dúvida, um expoente de complexidade, com o hospital como o seu máximo exemplo, realidade que tem preenchido os livros da gestão com evidências e estudos de caso, servindo de base a milhares de artigos e larga investigação.
Para esta situação concorre naturalmente a elevada e crescente tecnicidade dos meios de diagnóstico e tratamento, a incorporação de inovação, as múltiplas profissões envolvidas no setor, bem como a pressão externa sobre as organizações e decisores da saúde. Os cuidados de saúde não se esgotam mais em episódios isolados e sequenciais, mas sim, requerem redes apoiadas em tecnologias e soluções digitais.
A Nova Gestão Pública ou Managerialismo veio no quadro dos anos 70/80 introduzir uma abordagem empresarial à gestão das unidades de saúde do setor público, muito em especial aos hospitais, advogando a aplicação dos métodos da gestão privada e trazendo, em consequência, os seus gestores para os hospitais públicos. O novo paradigma passava então pela meritocracia em paralelo com o aumento da autonomia e poder de decisão dos órgãos de gestão, com especial incidência nos recursos humanos, aquisições e em soluções que entregavam, em maior ou menor parte, a prestação dos cuidados à gestão privada.
Suponha-se, então, que através da substituição de uma lógica burocrática por uma lógica orientada para o cliente se conseguiria melhorar os resultados, ser mais eficiente e aumentar a satisfação dos doentes, agora, designados por clientes.
Ora, se havia setor de atividade em que o peso das profissões era manifestamente preponderante, era o setor público da saúde, composto por organizações tipicamente burocrático-profissionais. Neste ambiente o administrador hospitalar tinha de ter formação especializada e fazer parte de uma carreira especial. Com a criação dos hospitais-empresa esta figura é questionada e assiste-se à entrada nos órgãos de gestão de uma diversidade de profissionais com múltiplas origens e formações de base.
Estranhamente e em sentido oposto, temos assistido nos últimos anos a um aumento da formação pós-graduada em gestão de unidades de saúde por parte de outros profissionais da saúde, designadamente médicos e enfermeiros, muitas vezes, chamados para os órgãos de gestão destas organizações. Este movimento, não sendo suficiente para evidenciar a necessidade de formação específica para melhor compreensão do sistema da saúde, confirma a necessidade da aquisição de conhecimentos na área por parte dos profissionais investidos em funções de gestão.
De facto, os sistemas de saúde são cada vez mais integrativos de múltiplas disciplinas e apoiados em trabalho em equipa, pelo que a formação específica em gestão de unidades de saúde torna-se essencial para a compreensão da linguagem, das metodologias de financiamento e produção, do funcionamento e, ainda, para a compreensão não setorizada dos problemas, fatores basilares para o sucesso organizacional.
Podemos, pois, concluir que a profissionalização alicerçada em competências específicas constitui um requisito essencial para a boa gestão das unidades de saúde, centrada no doente e na obtenção de resultados que acrescentem valor ao sistema de saúde.
O atual Ministério da Saúde tem atribuído prioridade aos gestores com formação específica em saúde e profissionais do setor na nomeação para os órgãos de gestão das unidades do SNS. Contudo, esta ação deverá ser acompanhada de uma avaliação séria do seu desempenho, que de uma forma objetiva avalie resultados, podendo assim contribuir para o alinhamento com os objetivos estratégicos aprovados pela Tutela, bem como enfraquecer a concorrência de pressões externas que, na defesa de interesses paralelos, tentam influenciar a agenda dos gestores e introduzir estratégias paralelas ou de curto prazo.