Em vésperas de Natal, era apresentada no Parlamento a nova lei de financiamento dos partidos. Congeminada em segredo em gabinetes à porta fechada, preparava-se para ser aprovada sem grande barulho aproveitando o facto dos portugueses estarem distraídos a sonhar com o bolo-rei.

De todos os partidos, só o CDS-PP e o PAN votaram contra. O CDS-PP não se limitou a votar, realizou um verdadeiro serviço público – expôs a situação na comunicação social. E foi assim que, em plena época natalícia, entre a missa do galo e a distribuição de presentes, os portugueses perceberam que os partidos se preparavam para aprovar uma lei que, entre outros abusos, lhes permitia a devolução total do IVA, uma forma encapotada de aumentarem o financiamento público. Perante a polémica que alastrou na comunicação social e nas redes sociais, o Presidente da República acabou por vetar a lei.

Chegámos à Páscoa e eis que a lei foi finalmente foi promulgada com a alteração na medida da devolução total do IVA, mas mantendo a possibilidade de angariação de forma ilimitada de financiamentos privados anónimos. Segundo o comunicado publicado no site da Presidência, o Presidente decidiu não vetar este novo diploma após as modificações feitas pela Assembleia da República, apesar da “objeção de fundo à alteração mantida, que elimina qualquer limite ao financiamento privado”.

O diploma aprovado passa, também, a permitir que os partidos utilizem gratuitamente espaços municipais ou de outras entidades públicas para as suas atividades partidárias, algo que até então a Entidade de Contas e sucessivos acórdãos do Tribunal Constitucional consideravam financiamentos ilegais.

Perante este cenário abusivo e vergonhoso, impõem-se indagar por que motivo os partidos não são financiados pelos contribuintes particulares e empresas através da doação de uma percentagem do IRS e IRC mediante a sua escolha. E na sequência dessa medida, estabelecer a obrigatoriedade de apresentarem uma lista pública dos doadores/financiadores. Qual a razão para continuarem a ser financiados pelo Estado? Ao defender este princípio, somos confrontados regularmente com uma ideia instituída e generalizada de que o financiamento público refreia a corrupção e a manipulação por parte dos grandes grupos privados. Mas será mesmo assim ou é apenas uma ilusão? Foi por ter financiamento público que o caso escabroso da PT/BES, com o aval do ex-primeiro-ministro José Sócrates, deixou de acontecer?

Se há algo que 40 anos de democracia não levantam dúvidas é que o financiamento público tem sido um chamariz para negócios obscuros e um garante para manter os mesmos partidos políticos em permanece rotatividade no poder,sem praticamente alterações no panorama político. Afinal, qual é o partido que consegue nascer e competir com este abuso pago por todos?

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.