Novamente deu à costa a fraude da “descentralização”, envolvida nas negociações da “estratégia” para o futuro quadro de fundos comunitários pós-2020. E o coro do MPI, dito Movimento pelo Interior, e um choro presidencial suavíssimo, regam o acordo PS/PSD, de lágrimas pelo interior.
Não é de descentralização que se trata. Chamar “descentralização” ao processo de transferência de competências para as autarquias locais é uma fraude. Descentralizar exige a regionalização, sem a qual não haverá hierarquia e delimitação coerente de competências entre os vários níveis de administração. Exige a reposição das freguesias para proximidade e participação democrática. Significa transferência de poderes e meios financeiros para programar e executar infra-estruturas e equipamentos. Exige a autonomia administrativa e financeira do Poder Local. Condições essenciais a um processo sério de descentralização.
E é absoluta e politicamente notável que os dois subscritores do acordo dito de descentralização, Costa e Rio, a propósito da regionalização, já tenham dito sim e não e talvez, e que agora façam passar por entre os pingos das notícias que, lá para a próxima legislatura, se volte a usar a palavra regionalização. Isto é cavalgar a toda a sela a ética, a seriedade e a coerência! Até porque, como diz o responsável e vice-presidente do PSD para estas coisas, e também patrono do MPI, Álvaro Amaro, “se os sábios concluírem que a regionalização é o melhor, os partidos que decidam”. Isto é, “os sábios” de uma prevista Comissão Técnica Independente, do acordo PS/PSD, vão agora esclarecer, mesmo contra a Constituição da República, o que as mentes iluminadas desses partidos não conseguiram fazer em mais de quatro décadas! Risível.
Não é de estratégia para defender o país na UE em matéria de fundos comunitários que se avança. O Quadro Financeiro Plurianual da União assume como elementos estratégicos as orientações de aprofundamento da integração capitalista, responsável pelo desenvolvimento desigual, injusto e assimétrico entre os diferentes países, da distância de Portugal face à UE e da desigualdade no território português. É uma posição comum PS/PSD, integrada na reforma da Zona Euro e no aprofundamento neoliberal e federalista. O que o PS e PSD propõem para o próximo Quadro Financeiro Plurianual assume a estratégia e as prioridades das transnacionais e do directório das grandes potências, dá o amém à redução de fundos (PAC, Coesão) e aceita a financeirização e centralização da sua aplicação.
Como é da história, as grandes trafulhices das classes dominantes trazem sempre a farsa à boleia. E que farsa mais farsola, e com mais farsantes, do que aquela que se ensaia para o dia 18 de Maio, de “cerimónia” para apresentação de “seis medidas para o interior do país” do MPI. Um dos responsáveis, aliás professor de direito constitucional, pela brutalização da Constituição da República, aprisionando o imperativo constitucional da regionalização por via de condicionamento referendário, o Presidente da República, patrocina a cerimónia. Os seus promotores, o MPI, são alguns bem conhecidos ex-ministros (PS e PSD) e etc., que tudo fizeram enquanto poder tiveram, para afundar – desertificar, despovoar, esvaziar – o interior.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.