Recentemente, uma conhecida repórter o Médio Oriente comentou no Twitter como os libaneses amam a vida. O país vai submeter-se a eleições legislativas no próximo domingo. A economia não está de boa saúde. Não há falta de guerras na região. E, no entanto, diz ela, os libaneses dançam que nem loucos todas as noites, numa espécie de desafio aos inúmeros regimes que ameaçam destruir o equilíbrio precário que reina há anos no País dos Cedros.
É verdade que os libaneses passaram a dominar com mestria a arte de viver no momento, indiferentes aos tumultos que assolam a região. Os que assistem de fora tentam compreender como é que um país tão pequeno e dilacerado consegue ser tão efusivo na sua boa disposição e hospitalidade.
A capital, Beirute, tornou-se uma cidade conhecida pelo seu incrível cosmopolitismo. Mulheres e homens de todas as religiões, identidades e origens, cruzam-se nas ruas, restaurantes, bares e discotecas, e tudo o que importa a esta geração pós-guerra é perder-se nas luzes da noite e no glamour, alheios ao xadrez político da sobrevivência.
Embora em Beirute não existam as mesmas restrições sexuais, religiosas e políticas que predominam em muitos países árabes, e a cidade se mostre orgulhosa da modernidade que alcançou, há todo um ‘subterrâneo’, onde pulsam os vícios de uma sociedade que decide ignorar deliberadamente os seus males.
Rana Eid é realizadora e filha de um general libanês que viu recentemente o seu documentário “Panoptic” censurado pelas autoridades militares libanesas, e, como tal, impedida de o exibir em salas e festivais de cinema. A censura deve-se ao facto de o seu documentário retratar os centros de detenção subterrâneos onde são mantidos, sem julgamento, imigrantes ilegais – na sua maioria etíopes, filipinos e egípcios –, detidos por não terem visto de trabalho ou por terem fugido de casas onde faziam trabalho doméstico em condições que roçam a escravatura.
Muitos países árabes têm sido criticados por organizações de Direitos Humanos por implementarem um sistema (Kefala) que explora trabalhadores migrantes e os sujeita à mercê dos seus empregadores, impedindo-os de viajar ou mudar de emprego.
Na parte final do documentário, Rana Eid filma a vida noturna de Beirute e o modo de estar de jovens que deslizam pela noite, em modo alienado, enquanto viram as costas ao passado, procurando desesperadamente viver o presente. Preocupa-a que esta geração não tenha qualquer interesse por política e se tenha rendido à desilusão.
Nas suas inúmeras contradições entre tradição e modernidade, o Líbano tem sido poupado, por enquanto, a uma guerra aberta, mas, ao recusar-se a enfrentar os graves problemas existentes, corre o risco de abraçar um futuro sem esperança e sem sentido para os mais novos.