Em causa está o projeto hegemónico global norte-americano e o desafio que lhe tem sido feito pela China e pela Rússia. A Ucrânia e Taiwan desempenham funções incrivelmente semelhantes nesse jogo de xadrez.

Importa, pois, perceber, porque é que a Ucrânia é tão importante para a Rússia, Taiwan é tão importante para a China, e a Ucrânia e Taiwan são ambos tão importantes para os EUA. A resposta ajudar-nos-á a compreender melhor as origens do presente conflito na Ucrânia, e de um futuro a ter lugar em Taiwan. A geoestratégia auxilia a encontrar as respostas.

O controlo daqueles dois países, respetivamente pela Rússia e pela China, permite-lhes contrariar as aspirações hegemónicas de Washington.

A importância de Estados como a Ucrânia e Taiwan deriva, acima de tudo, não do seu poder, mas da sua localização sensível, da sua proximidade à Rússia e à China, e do modo como podem ser utilizados, se controlados por uma potência hostil. Representam um escudo protetor vital para aqueles dois países. A sua relevância e valor geoestratégico emana da sua geografia. Permitem ou impedem o acesso da Rússia e da China, assim como dos EUA, a regiões de um incontornável valor geostratégico.

A perda da Ucrânia pela Rússia, no rescaldo do colapso da União Soviética, representou um cataclismo geoestratégico para Moscovo, pois limitou drasticamente as suas opções.

Segundo Brzezinski, mesmo sem os Estados bálticos e a Polónia, se a Rússia conseguir manter o controlo da Ucrânia ainda tem condições para ser um império eurasiático. Na verdade, ele estava a pensar nas consequências negativas que isso poderia ter para a concretização do projeto global norte-americano.

O convite reiterado à Ucrânia para se juntar à NATO insere-se nesse projeto. Com a instalação de bases militares da NATO às portas de Moscovo, a Rússia ficaria numa profunda e inaceitável vulnerabilidade.

Uma situação semelhante ocorre no sudeste asiático relativamente a Taiwan. Se os Estados Unidos permitirem que a China controle Taiwan, a sua posição na região do Indo-Pacífico será bastante afetada, assim como as suas pretensões hegemónicas. A sua estrutura de alianças na região entrará em colapso, e o seu lugar seria ocupado pela China.

Numa lógica de soma nula, os benefícios de uns traduzem-se sempre em prejuízos para outros. Os ganhos para a China, a advirem do controlo de Taiwan, terão um impacto inevitável na posição norte-americana na região, afetando decisivamente a credibilidade de Washington no Indo-Pacífico.

O domínio de Taiwan por Pequim – independentemente do modo como isso se possa vir a materializar –, ao que importa acrescentar a incorporação de Hong Kong e Macau na China, fará com esta emerja não apenas como potência regional, mas como uma potência mundial de primeira grandeza.

Uma reintegração militar forçada de Taiwan seria devastadora para as pretensões hegemónicas norte-americanas. Como o controlo da Ucrânia por Moscovo, também a reunificação chinesa colidirá frontalmente com os interesses vitais norte-americanos.

A interferência norte-americana prolongada na Ucrânia como em Taiwan não tem a ver com a defesa da democracia. Trata-se exclusivamente da preservação dos interesses geopolíticos de Washington. Portanto, o que está em causa nos dois casos não é a luta pela liberdade ou pela democracia, mas sim pelo poder.