A designação BRICS

1. Os BRICS, presentemente, são um conjunto de cinco países – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul –, uma espécie de “aliança” com a pretensão de exercer uma influência geopolítica forte a nível mundial. Estes países estabeleceram entre si um código de conduta na base de princípios gerais, como a não-interferência, a igualdade e o benefício mútuo.

Não são, assim, nem um bloco económico tradicional, apesar dos objectivos económicos que prosseguem, nem uma associação formal, tipo Mercosul.

O grupo inicial BRIC(s) – os primeiros quatro países – tem data de fundação 16 de Junho 2009, apesar do encontro informal havido por iniciativa da Rússia em Setembro de 2006, em Nova Iorque, à margem da 61ª Assembleia Geral das Nações Unidas, que acabou por abrir “portas” para formas futuras de cooperação.

A África do Sul só se juntou em 2011, aquando da 3ª Cimeira, passando então o grupo a designar-se de BRICS (S de South Africa, e não do plural inicial).

A designação BRIC(s) teve, por baptismo, um estudo de 2001, “Building Better Global Economic Brics”, da autoria do economista Jim O’Neil, do banco americano Goldman Sachs, que antecipava para aqueles quatro países de economia emergente potencialidades de desenvolvimento que poderiam levá-los a rivalizar fortemente, num prazo alargado, com as grandes potências industrializadas da economia mundial, sensivelmente as economias integrantes do G7. Este grupo reuniu recentemente em Cimeira na Alemanha (26/28 de Junho último),  preocupado, sobretudo, com a expansão da influência dos BRICS no Mundo e, em especial, com a China, que tem tido maior sucesso e está a contribuir para o lento desmoronar da hegemonia do “Ocidente”.

A evolução BRICS

2. A evolução do grupo assenta no conceito de grandes mercados emergentes, tendo em conta explorar as oportunidades decorrentes da sua elevada população, grandes territórios e recursos variados, no sentido da melhoria das condições e peso de decisão na cena internacional. Os BRICS procuram posicionar-se como uma voz que reúne interesses próprios, distintos da governação dominante a nível mundial e sem sujeição aos ditames dos países desenvolvidos.

Para os BRICS, instituições como a ONU, o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional (FMI), instrumentos gestores e de domínio da sociedade e economia mundiais, não servem os seus interesses, nem os da economia global no seu todo e, por isso, devem ser ajustadas. Neste contexto, defendem que, às economias emergentes, deve ser assegurado um papel de maior relevo nessas instituições.

3. Os BRICS, desde a sua institucionalização em 2009, têm vindo a funcionar na base de Cimeiras rotativas, uma vez que não houve um tratado assinado entre os primeiros-ministros ou chefes de Estado dos países membros que definisse um formato organizativo, pelo que também não têm uma sede fixa.

No entanto, pode apontar-se para uma certa “institucionalização horizontal”, devido ao funcionamento na base de grupos, parcerias ou actividades concretas.

O Banco de Desenvolvimento dos BRICS

4. Na 6ª Cimeira em Fortaleza, Brasil (15 de Julho 2014), foi oficializada a criação do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), mais conhecido como Banco dos BRICS, com o capital de 100 mil milhões de dólares, subscrito em partes iguais por cada um dos cinco países, e um fundo de reserva monetário de idêntico valor com sede na cidade de Xangai, China, que tem como primeiro presidente uma personalidade indiana, aliás, o país de quem surgiu a ideia da fundação do NBD.

A grande finalidade deste Banco é o financiamento de projectos de infraestruturas e de desenvolvimento, com vista a compensar as graves insuficiências de crédito às economias emergentes prestadas pelas principais instituições financeiras internacionais, Banco Mundial e FMI.

Comparando o Banco dos BRICS com o Banco Mundial em termos de capital e órgãos de gestão, temos um Banco Mundial detido em elevada percentagem pelos EUA, sendo o seu presidente um representante do governo norte-americano. Aqui, certos princípios, como a igualdade, não contam. Domina o “Senhor” absoluto do Mundo!

A criação do NBD foi, sem dúvida, a decisão de maior confronto com os interesses das economias desenvolvidas, aliás, na sequência da leitura que fazem do sistema financeiro dominante que só serve e protege os interesses dos países desenvolvidos.

Países em torno dos BRICS

5. Há quatro países que manifestaram interesse em entrar para os BRICS: Turquia, Egipto, Indonésia e Argentina. Existe ainda uma vintena de países observadores.

No entanto, o grupo continua a funcionar em torno dos cinco que o integram.  A questão do alargamento anda, certamente, a ser ponderada e amadurecida face ao estado de organização, e de pensamento, embrionários do grupo, pois o que os liga é, no fundo, o deslocamento do eixo de tomadas de decisão no Mundo – hoje concentrado nas mãos dos EUA e um pouco na Europa, esta em situação de subalternidade.

A Guerra da Ucrânia e os BRICS

6. A 14ª Cimeira dos BRICS realizou-se nos dias 22 e 23 de Junho de 2022, no contexto de muitas Cimeiras e Fóruns quase em simultâneo.

Aquando da Assembleia Geral das Nações Unidas de 20 de Março último, Índia, China e África do Sul abstiveram-se na votação que condenava a Rússia pela invasão da Ucrânia. O Brasil votou a favor, embora o seu embaixador tenha condenado as sanções à Rússia, alegando que em nada facilitariam a retoma do diálogo.

Esta diferença de votação não parece ter beliscado o funcionamento dos BRICS. Assim, a Cimeira realizou-se e, segundo alguns analistas, até fortaleceu o relacionamento entre os seus membros, tendo-se falado pouco da guerra da Ucrânia e muito da cooperação económica com resultados bem concretos, sobretudo nas trocas comerciais, que têm aumentado fortemente em termos de petróleo e gás entre Índia, China e Rússia.

O Brasil, por exemplo, preferiu vincar a merecida representação que as economias emergentes deveriam ter e não têm em instâncias como a ONU, Banco Mundial e FMI, tema muito caro sobretudo à Índia, Brasil e África do Sul.

No fim, um apelo a negociações para terminar com a Guerra Rússia/Ucrânia. É evidente que, numa outra linha, há quem defenda que sendo um dos BRICS, a Rússia, país que desencadeou a guerra, este facto terá levado a uma paralisação da sua influência no Mundo.

Não vou seguir essa linha, independentemente da situação complexa que se criou e da desinformação constante propagandeada por um Ocidente “cada vez mais estreito”.

Estou mais na linha de Boaventura Sousa Santos quando diz que os BRICS representam as novas faces do não-Ocidente, pois estes países estão a atrair muitos outros para a sua órbita, através de trabalho real e da voz credível de defesa dos interesses das economias emergentes em África, Ásia e América Latina.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.