O que se está a passar no Sri Lanka pode ser o detonador para outros pontos do mundo. Uma inflação de 54 por cento num país paupérrimo e uma revolta popular que invade e manieta os meios do Estado porque não há dinheiro no bolso para comprar o básico.
Se a Europa pensa, sobretudo os poderes instituídos, que está vacinada contra a contestação social nas ruas pelos mesmos motivos, está muito enganada.
Os efeitos devastadores da invasão russa da Ucrânia são ainda embrionários, apesar de a crise já se fazer sentir. A carestia é o destino certo se não se chegar rapidamente a uma solução de paz. E é visível que a recessão na Alemanha, que é a casa das máquinas da economia europeia, é grave e acrescenta ecos sombrios aos dias que vivemos.
Portugal está, aparentemente, numa bolha artificial e rara de uma confortável maioria absoluta que dá estabilidade política ao Governo, mas que está longe de ser um muro indestrutível se acontecer uma tempestade perfeita conjugando diversos factores.
Ora, caos no Serviço Nacional de Saúde, preço da gasolina elevado, bens de consumo a galopar nos preços e ainda uma descoordenação na acção executiva como a protagonizada por Pedro Nuno Santos, não são bons sinais de saúde política e contribuem para a deterioração e desgaste da dita maioria absoluta.
E agora três dias com o país a arder de norte a sul, desmontam e desmistificam o propalado reforço dos meios de prevenção e defesa do ministro da Administração Interna.
O calor e o vento não explicam nem são desculpas para imagens tão dilacerantes. A comunidade não pode estar em sobressalto cada vez que as temperaturas sobem, pois estudos científicos têm revelado que teremos muitos mais dias por ano de calor intenso.
Não interessa se são as alterações climáticas, são apenas factos e não teorias da conspiração. Logo, as populações têm de voltar a cimentar uma percepção de confiança, no sentido de as suas vidas e bens estarem em segurança contra qualquer fogo.
O Governo tem de apresentar uma estratégia de coesão territorial que tenha em conta o interior e que evite que se expandam mais áreas desertificadas ou se cresça para um inusitado monopólio do eucalipto.
E para lá dos meios de prevenção e combate serem reforçados, teremos de ter a coragem de cortar as mãos (em sentido figurado) criminosas responsáveis por centenas de ignições. Isso só será possível com uma reforma da Justiça (tão urgente e necessária), que terá de contemplar um agravamento penal para quem ateia os fogos sem qualquer compaixão pela natureza, pelas pessoas, seus bens e animais. Um incendiário é um vil criminoso, não tem regeneração possível.
Com 100 dias de Governo, e o debate do Estado da Nação na próxima semana, sente-se que a equipa de António Costa vai passar por uma série de atribulações que uma maioria absoluta não antevia. Serão tempos muito difíceis e o melhor antídoto contra eles, reforço, é uma incessante busca por uma solução de paz na Ucrânia. A origem actual dos males do mundo vem dali.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.