O início desta XV legislatura tem sido atípico, desde logo pela antecipação das eleições e, a seguir, pelo atraso imenso na posse da Assembleia da República e da equipa governamental, prolongando-se pela forma como tem decorrido a ação executiva, presa, ainda, pelos restos do Governo minoritário do PS, limitada por uma conjuntura demasiado volátil e focada na contenção das crises sectoriais e nos episódios de descoordenação que se têm multiplicado.
O Orçamento do Estado deste ano é um dos maiores exemplos de um pedaço de passado que ficou desarrumado e se intrometeu no presente, sendo tratado como um interregno necessário. Foi decalcado da proposta apresentada em outubro de 2021, que foi chumbada no Parlamento e gerou a crise política que levou à antecipação das eleições; e usado como trunfo e promessa eleitoral.
Mas é um orçamento feito pelo ministro e pela equipa das Finanças do anterior Governo, em função de uma negociação política num quadro político que já não existe e numa conjuntura que está completamente ultrapassada. Tem uma vigência reduzida a um semestre e uma vida política ainda mais reduzida, de apenas três meses e meio, até à apresentação da proposta orçamental para 2023, e por isso, foi aprovado rapidamente, com pouca discussão.
A questão é que todos os problemas que vão surgindo no caminho da governação têm sido empurrados para o Orçamento do Estado para 2023, como se o período de governação só contasse a partir daí, mesmo não sendo verdade e de termos a perceção de que o novo arranque se fará a partir de números negativos. É assim com a resposta ao acelerar da inflação – muito acima do antecipado e menorizada no OE2022 –, os aumentos da Função Pública, os recursos financeiros devidos pela descentralização de competências para os municípios, com investimentos, etc.
O OE2023 será o primeiro exercício orçamental da responsabilidade de Fernando Medina, mas, mais do que isso, começará aqui, verdadeiramente, a legislatura de maioria absoluta do PS, já solto das amarras dos compromissos negociados à esquerda. A 10 de outubro, uma segunda-feira, começaremos a ter indicações mais claras sobre as ideias que António Costa tem para o país e que caminho traça para ultrapassar as adversidades causadas pela conjuntura, para que seja mais do que um modelo de sobrevivência, uma preparação do futuro.
Ou não, e a governação continuará a ser um exercício de navegação de cabotagem.