Para resolver o grave problema do alojamento é necessário expandir quer a habitação social, a intermédia e a de mercado, como já tinha referido no artigo anterior.

Retomando a questão do envolvimento do sector privado na habitação social, para muitas autarquias esta pode ser uma forma interessante de expandir a habitação a preços mínimos. Em vez de se endividar para construir bairros sociais, é possível contratualizar com privados a sua construção, o que reduz os encargos ao subsídio de renda, uma fracção do investimento inicial.

Como já foi referido, seria conveniente o envolvimento da administração central na habitação social, quanto mais não seja na definição de parâmetros gerais. Em relação às autarquias haverá, possivelmente, margem para aumento do actual parque habitacional, tendo em atenção dois factores: o actual peso e os níveis das rendas. Para municípios onde o peso já seja elevado, não fará tanto sentido investir, bem como naqueles em que as rendas de mercado são baixas.

Em relação ao terceiro sector, onde se destacam as Misericórdias e dentro destas, o caso muito especial de Lisboa, parece haver também a necessidade de racionalização na atribuição dos benefícios da habitação social, já que parece haver um nível elevado de arbitrariedade. Ainda assim, julgo que faria mais sentido que se concentrassem nas rendas intermédias e deixassem a função de habitação social para o sector público. Isso seria uma forma de preservar a obtenção de rendimento que lhes permita financiar todas as outras funções sociais que desempenham.

Não se compreende como é que a Santa Casa tem, em simultâneo, tanto património imobiliário por reabilitar em Lisboa, onde existe uma tão flagrante escassez de habitação, e 137 milhões de euros em depósitos, em 2020 (onde pára o relatório e contas de 2021?).

Aquilo que designei por segmento intermédio é o das rendas que estão entre os valores quase simbólicos das rendas sociais e os valores de mercado, podendo variar segundo os rendimentos dos agregados familiares.

Antes de prosseguir é importante fornecer alguns dados. Em primeiro lugar, o salário mediano líquido é de cerca de 1000 euros, o que significa que temos mais de dois milhões de trabalhadores que ganham menos do que isso. Em 2022, o salário mínimo é de 705 euros. Em termos estatísticos oficiais, existe a definição de taxa de sobrecarga que é a percentagem de famílias para as quais as despesas de habitação representam 40% ou mais do seu rendimento. Ou seja, para mais de dois milhões de trabalhadores, uma renda superior a 282 euros já os coloca em situação de sobrecarga.

Isto quer dizer que para muito mais de metade da população portuguesa as actuais rendas de mercado são inacessíveis, mas também que não é realista ter mais de metade do mercado de arrendamento em habitação social. Daí a necessidade de expandir um sector intermédio, de rendas limitadas (continua).

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.