Se alguém lhe disser que lutas de bots de IA, rogue avatares e guerra cibernética vão ser a norma em 2023, talvez fique sem vontade de sair de casa. No entanto, também é provável e expectável que os cibercriminosos ataquem infraestruturas críticas que levem a cortes de energia, pelo que nem em casa estará a salvo das ameaças cibernéticas. Mas não é caso para desespero pois há reforços a caminho, com o setor da cibersegurança a recrutar atualmente mais 3,4 milhões de profissionais para neutralizar esta ameaça.

É um facto incontornável de que o ritmo dos ciberataques está a aumentar. Registamos atualmente mais de dois milhões de ataques anuais com um custo económico estimado em 10,5 biliões de dólares em todo o mundo em 2025 (3 biliões de dólares em 2015, um crescimento anual de 15%).

Portugal não tem sido exceção, pois temos assistido a um número cada vez maior de ataques, incluindo a infraestruturas críticas bem como serviços essenciais. De acordo com o relatório do Centro Nacional de Cibersegurança este ano registou-se um aumento de 26% no número de incidentes quando comparado com o ano anterior.2023 será certamente desafiante para a cibersegurança e estas são as cinco tendências que vão marcar o ano:

  1. A corrida às armas no ciberespaço vai acelerar

O campo de batalha está cada vez mais sofisticado, com ambas as partes a recorrer a tecnologias avançadas como a IA para atacar e proteger os sistemas. No caso da cibersegurança, a Inteligência Artificial tem sido utilizada primariamente para identificar padrões de comportamento anómalos de resposta humana. O volume de atividade suspeita e o número de falsos positivos faz com que os técnicos de cibersegurança estejam frequentemente assoberbados.

As boas notícias são que em 2023 e no futuro seremos capazes de confiar mais nas máquinas e utilizar a IA para automatizar os controlos de segurança e mecanismos de resposta, ajudando-nos assim a responder de forma mais rápida e precisa, reduzindo os períodos de indisponibilidade e protegendo dados críticos, tanto pessoais, como de negócio.

Embora a Inteligência Artificial possa automatizar o processo de deteção e eliminação de ameaças, esta é baseada no conhecimento daquilo que estão à procura, o que constitui um incentivo aos cibercriminosos para conceber ataques inéditos e, também, para as empresas continuarem a acompanhar o ritmo das tendências emergentes. Se por um lado as organizações recorrem à IA para se protegerem, por outro, também os cibercriminosos se socorrem das mesmas tecnologias para executarem os seus ataques. Por fim, temos o desenvolvimento da computação quântica, que, no futuro, poderá significar a destruição das defesas de hoje, em meros segundos.

  1. Cuidado acrescido com quem pensamos estar a falar no metaverso (e manter a carteira digital s protegida)

2023 vai ser um ano importante para o metaverso com a Meta, Microsoft, Virbela, entre outros, a apostar na popularização dos mundos virtuais. Na DXC Technology, por exemplo, um inquérito recente entre os colaboradores revelou que 57% destes tinha já participado num evento no nosso ambiente de metaverso privado, com mais de um terço a indicar estar mais envolvido nas suas funções como consequência disso. Em ambientes contidos e seguros, o metaverso pode acrescentar uma emocionante dimensão 3D ao trabalho, ao descanso e ao lazer. Mas em qualquer vasto mundo digital coloca-se a questão da veracidade. Como é que sabemos que a pessoa com quem pensamos estar a falar é a mesma que diz ser? Especialmente quando a sua ‘identidade’ é a de um avatar digital que pode ter, ou não, semelhanças com a sua pessoa física. Ainda segundo o mesmo relatório do CNCS o furto de identidade foi um dos crimes mais registados no último ano. Os certificados digitais, possivelmente desenvolvidos com blockchain, poderão ajudar nisso.

Os certificados digitais também poderão ajudar a assegurar transações virtuais no metaverso, onde os utilizadores vão ser tentados a abrir as suas carteiras digitais e pagar serviços que poderão ser fictícios ou simplesmente não entregues. Em 2023, com o metaverso em expansão, crescerá também a nossa consciência destes riscos e das melhores formas de os evitar.

  1. Aumento dos ataques de ciberseguraça de âmbito geopolítico vai impulsionar a inovação na defesa

O ataque russo à Ucrânia recordou-nos de forma crua e brutal que a guerra agora é travada de forma híbrida e que o risco de ciberataques com motivações geopolíticas é real e presente. Para sublinhar o quão assustadoramente comum a ciberguerra se tornou, basta-nos pensar no facto de muitas coberturas seguradoras estarem agora a ser reformuladas para excluir atos de guerra cibernética, o que cria novos desafios para a mitigação de riscos cibernéticos.

Com tensões geopolíticas atuais, esta ameaça deverá continuar ativa em 2023. E com mais de 70 países a ter eleições legislativas em 2023 (muitas vezes alvo de interferências por Estados terceiros), este será um ano de grandes desafios para a cibersegurança.

Contudo, temos muito a aprender do que testemunhámos nos últimos 12 meses. Lindy Cameron, Chief Executive Officer do National Cyber Security Centre do Reino Unido classificou a resposta de cibersegurança ucraniana à Rússia como “exemplar”, afirmando que é possível aprender muito com esta.

  1. Os ataques de cibersegurança vão ser dirigidos a infraestruturas nacionais críticas

Quando as luzes se apagam ou há um corte de gás, não é habitual pensarmos que o fornecedor de energia elétrica ou que a rede elétrica foram vítimas de uma falha de cibersegurança. Mas esta é uma ameaça crescente.

A cibersegurança de Tecnologia Operacional (OT) constitui o campo de batalha emergente para os ciberataques que têm como alvo os sistemas que controlam e automatizam fábricas e infraestruturas civis, como centrais energéticas e barragens. Muitos destes sistemas atualmente ligados de alguma forma à internet são um alvo cada vez mais apetecido para ciberataques.

Em 2022,diversas autoridades internacionais para a cibersegurança  emitiram alertas sobre operações cibernéticas maliciosas russas e ataques potenciais a infraestruturas críticas e a descoberta de novos elementos maliciosos de malware desenvolvidos especificamente para OT como o Industroyer2 e o InController/PipeDream.

Também neste campo Portugal não foi exceção, com aproximadamente 14% dos ataques dirigidos a infraestruturas críticas e serviços essenciais. O próprio contexto internacional é propenso a atos criminosos que têm como alvo este tipo de tipo de infraestruturas.

Com as atuais tensões geopolíticas, as ciberameaças em OT vão aumentar em 2023, pressionando o setor a estar um passo à frente dos criminosos e proteger as organizações em matéria de cibersegurança.

  1. As oportunidades profissionais na cibersegurança vão crescer ainda mais

Os indicadores variam mas as estimativas apontam para uma escassez de 3,4 milhões de profissionais a nível global no setor da cibersegurança. Com ameaças crescentes alavancadas por tecnologias avançadas, este número deverá crescer ao longo do ano.

O fosso de qualificações em cibersegurança está a criar oportunidades profissionais para pessoas de todas as idades e percursos académicos e profissionais. Mas as oportunidades não são exclusivas para licenciados. Muitas empresas estão a dar a oportunidade a adultos para ganharem qualificações em cibersegurança, uma opção para profissionais veteranos que, com frequência, têm o perfil indicado para funções de primeira linha na defesa contra o cibercrime.

Em Portugal, a par de outras iniciativas, foi lançada o mês passado a C-Academy, um programa que pretende minimizar a falta de recursos qualificados na área de cibersegurança. Em conjunto com diversas instituições de ensino este programa tem como objetivo chegar a quase 10.000 formandos até ao final do primeiro trimestre de 2026.

As ameaças cibernéticas em 2023 serão múltiplas, e de uma quantidade e complexidade crescentes. Mas tal como a ameaça cresce, também aumenta a nossa capacidade de aplicar as mais recentes tecnologias, abordagens e talento para as combater. A corrida ao armamento na cibersegurança é uma analogia apropriada – e o lado dos bons tem de ganhar.