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Inflação e subida das taxas de juro torna fecho de contas das empresas mais desafiante

A inflação, a instabilidade geopolítica e a subida dos juros são desafios ao fecho de contas das empresas, admite Rui Carvalho, da EY. Tecnologia é um aliado valioso nesse processo, que permite uma avaliação correta das empresas.
24 Fevereiro 2023, 15h20

Num momento marcado por instabilidade geopolítica, pela escalada dos preços e pelo aumento das taxas de juro, o encerramento de contas das empresas poderá revelar-se mais desafiante do que noutros anos, alerta Rui Carvalho, associate partner da EY, em declarações ao Jornal Económico (EY). Ainda assim, o especialista faz questão de sublinhar que esse processo é “sem dúvida” um aliado do tecido empresarial português na hora de tomar decisões, uma vez que permite a “correta análise e avaliação da sua posição financeira e desempenho”. E a tecnologia pode ser um parceiro valioso nesse exercício anual, afirma o mesmo.

Mas vamos por partes. Regra geral, o fecho de contas deve ser feito até ao final do primeiro trimestre, devendo ser cumpridos uma série de passos. Rui Carvalho enumera-os: primeiro, é preciso rever e reconciliar as contas; Depois, há que analisar as provisões e imparidades, calcular as depreciações e amortizações, bem como os ajustamentos cambiais; Segue-se o apuramento da estimativa de imposto e impostos diferidos; E os últimos passos são a preparação das demonstrações financeiras, a auditoria externa e emissão de certificação legal de contas (se aplicável) e, por fim, a aprovação por parte da gerência ou administração. Portanto, está em causa um processo com múltiplas etapas, mas que, assente na “preparação de informação tempestiva, fidedigna, precisa e de qualidade”, realça o associate partner da EY, pode ser mesmo um aliado das empresas na tomada de decisões.

A atual conjuntura ameaça, porém, tornar esse exercício mais complexo do que noutros anos. A instabilidade, a inflação e a subida dos juros podem “afetar significativamente a performance das empresas” e isso pode ter “impactos relevantes na elaboração das demonstrações financeiras”, explica o referido especialista. E detalha: “A instabilidade geopolítica pode afetar as operações de uma empresa, seja por meio de restrições comerciais, aumento do risco político, ou dificuldades de acesso a recursos ou mercados o que naturalmente”.

Já no que diz respeito à subida considerável das taxas de juros, Rui Carvalho salienta que essa evolução traz “desafios acrescidos” ao encerramento de contas, uma vez que pode ter impacto, por exemplo, “nas taxas de desconto utilizadas para efeitos de testes de imparidade e justo valor”. E quanto à escalada dos preços, essa trajetória, observa o mesmo, pode “indiciar potenciais imparidades, caso não seja possível repassar o aumento dos custos de produção preço praticado para o cliente final”. “Todos estes efeitos deverão ser devidamente acautelados e refletidos nas respetivas contas e demonstrações financeiras”, enfatiza o associate partner.

Por outro lado, a haver pressão de prazos, o mesmo especialista salienta o papel do “planeamento rigoroso” e da “devida identificação e definição de cada um dos responsáveis”, o que permite uma gestão eficiente do processo em questão, diz ao JE. “É uma das melhores práticas para tornar todo este processo mais eficiente. Contudo, a tecnologia é também um forte aliado na otimização de todo o processo, garantindo a execução de várias tarefas num menos espaço de tempo”, reconhece Rui Carvalho. Exemplo desse contributo das ferramentas tecnológicas é a automatização de tarefas até aqui manuais, “permitindo robotizar a reconciliação e consolidação de contas”, mas também as funções de colaboração – o que permite a colaboração e partilha de dados entre várias equipas –,de workflow – o que se traduz na organização e sequencialidade na execução de tarefas –, de monitorização de calendário e de data analytics, o que permite relacionar dados e “identificar anomalias que exijam correção ou mesmo fraude”. “A tecnologia capacita um processo de fecho de contas mais célere, com menor custo e esforço e com maior qualidade, reduzindo erros e também riscos”, resume o especialista.

Por sua vez, Ricardo Xavier Correia, diretor da EY, nas áreas de tax technology & transformation, avisa que “é fundamental” que os sistemas de contabilidade estejam atualizados em linha com a legislação (contabilística e fiscal) em vigor. Isto de forma a “potenciar a sistematização e uniformização de dados, que são críticos na automatização dos processos.” E dá um exemplo: a configuração de um plano de contas segundo o normativo nacional e parametrização da geração de um ficheiro SAF-T (PT) de contabilidade é um “contributo muito relevante para a persecução da automatização de demonstrações financeiras”.

“Esta configuração ou atualização dos sistemas de contabilidade também vem permitir outros benefícios, tais como a capacidade de automatizar o reporte fiscal, a análise, o cruzamento e avaliação de consistência entre o reporte fiscal e contabilísticos, entre outros, potenciando o uso de tecnologia nos processos da função fiscal e financeira”, salienta Ricardo Xavier Correia.

Faturação certificada
Por outro lado, Ricardo Xavier Correia explica també, que o uso de um programa de faturação certificado pela Autoridade Tributária (AT) contempla funcionalidades relevantes ao nível do controlo e arquivo documental. “Uma das funcionalidades mais relevantes é a capacidade de exportar o ficheiro SAF-T (PT) de faturação, que inclui todos os dados relevantes tanto de dados mestre (como clientes e impostos), como transacionais de cada documento emitido”, realça.

O especialista avança ainda que o formato e conteúdo desse documento podem ser usados em processos automatizados, “onde em conjunto com outros dados (do sistema de contabilidade, em caso de sistemas não integrados), permitem a corroboração e reconciliação de contas de clientes e impostos”.

Medidas fiscais com impacto no fecho de contas
Ao contrário do que aconteceu noutros anos, neste momento, não existem alterações legislativas substanciais que impactem o encerramento das contas de 2022, explica Alexandra Nunes, diretora da EY, nas áreas de global compliance & reporting, mas há duas recomendações da Comissão de Normalização Contabilística a ter em conta nesse processo. Em causa estão orientações que versam, pormenoriza a especialista, sobre o tratamento dos impactos da invasão russa da Ucrânia no relato financeiro das entidades sujeitas ao Sistema de Normalização Contabilística (SNC) e ao Sistema de Normalização Contabilística para as Administrações Pública (SNS-AP).

Já do ponto de vista fiscal, as principais alterações a ter em consideração no fecho das contas relativas ao último ano, adianta Alexandra Nunes, prendem-se com o Orçamento do Estado para 2022. “De realçar o regime do Incentivo Fiscal à Recuperação, bem como algumas disposições transitórias em benefício de pequenas e médias empresas aplicáveis ao período de recuperação dos efeitos económicos decorrentes da pandemia da covid-19. Por exemplo, as taxas de tributação autónoma não são agravadas para sujeitos passivos com prejuízos fiscais”, esclarece a responsável.
A diretora da EY nota, por outro lado, que o enquadramento legal e fiscal tem sido simplificado, facilitando-se o fecho de contas, por exemplo, das pequenas e médias empresas, mas há “obviamente” ainda espaço para melhorias, remata.

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