O ataque israelita às instalações nucleares iranianas, autorizado por Benjamin Netanyahu e conduzido sob o olhar complacente dos Estados Unidos, marca um divisor de águas perigoso na já frágil arquitetura de segurança global.

No próprio discurso do primeiro-ministro israelita, justificou-se o bombardeamento com o argumento de que o Irão já opera enriquecimento de urânio em níveis alarmantes — um fato conhecido e monitorado pela Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), que, não por acaso, sempre alertou que atacar reatores ou refinarias não é uma solução, mas o prenúncio de uma catástrofe transfronteiriça.

A ação de Israel ignora deliberadamente este princípio básico: instalações nucleares não são apenas ativos militares ou científicos, mas pontos de potencial colapso ambiental e humano. O ataque mal calculado poderia ter provocado a libertação de material radioativo, vitimando imediatamente milhares de pessoas no Irão, Iraque, Golfo Pérsico e além, contaminando solos, aquíferos e criando uma nuvem radioativa que não distingue credos nem bandeiras. Ainda é necessário entender o impacto da ação do governo de Israel.

O precedente que se abre, a partir do dia 13 de junho, é ainda mais alarmante: o de que se pode politizar o risco nuclear para exibi-lo como ferramenta de coerção e intimidação regional, sem qualquer consideração pelas consequências humanitárias de longo prazo. Esse gesto, respaldado por Washington, demonstra que os Estados Unidos, outrora fiadores da ordem e da contenção, optaram por endossar uma escalada de imprevisíveis proporções.

Se essa conduta persistir, o mundo pode estar às portas de um dos maiores flagelos da história da humanidade — um Chernobyl militarizado, acionado como expediente político. Netanyahu e o seu governo, nesse acto, mancham para sempre o legado de Israel como baluarte do direito humanitário internacional, erguido em grande parte a partir da memória do Holocausto e da promessa de jamais permitir barbáries.

Convém recordar que, no início da guerra da Ucrânia, o mundo inteiro estremeceu diante da possibilidade de um acidente catastrófico na central nuclear de Zaporizhzhia — a maior da Europa. Bastaram alguns disparos nas imediações para que governos, organizações multilaterais e a própria AIEA soassem o alarme sobre o risco de um novo Chernobyl, cujas consequências, transcorridas décadas, ainda assombram gerações. O princípio é o mesmo e deveria ser inegociável: instalações nucleares civis não podem, sob hipótese alguma, converter-se em alvos militares. O precedente aberto agora por Netanyahu torna ainda mais frágil essa salvaguarda essencial, expondo milhões a um flagelo que, uma vez desencadeado, não conhece fronteiras nem cessar-fogo.

Não se trata de excluir Teerão de suas responsabilidades ou de ignorar as ambições nucleares iranianas — que devem ser contidas por meios diplomáticos e verificações rigorosas. Trata-se de reconhecer que a violação de um princípio de segurança nuclear ameaça o planeta mais do que qualquer retórica de dissuasão. Israel, sob Netanyahu, revela ao mundo que prefere desestabilizar toda a vizinhança a submeter-se a uma ordem multilateral de negociação e fiscalização.

Assim, o dia 13 de junho de 2025 torna-se o marco de um retrocesso: a data em que se revelou, sem disfarces, a perda da capacidade americana de liderar a paz no sistema internacional. Com o beneplácito de Washington, Tel Aviv sinalizou que vale tudo — até colocar em xeque a saúde de milhões — para afirmar a sua supremacia estratégica.

Se o mundo ainda deseja evitar a repetição de Chernobyls e Fukushimas convertidos em armas políticas, terá de reconstruir, com urgência, as bases de um consenso nuclear que Netanyahu e seus aliados resolveram dinamitar.