Apesar da ressaca pós-Trump e pós-Brexit, não existem grandes dúvidas que a globalização, com a crescente mobilidade de capital intelectual, tecnológico e financeiro e o incremento do comércio internacional, é uma tendência imparável. Por mais muros que se possam construir, teremos cada vez menos barreiras e seremos mais interdependentes.
O que tem feito Portugal neste contexto? Fruto da sua situação particular dos últimos 6 anos, Portugal teve o imperativo de olhar e ir para fora e fê-lo de duas formas: através da emigração de parte do nosso talento profissional e através do incremento das exportações de bens e serviços. Através de muitas das suas empresas, assumiu uma postura mais competitiva nos sectores de bens transaccionáveis, exportou, criou e consolidou parcerias lá fora, começou a estar presente nos mais importantes canais de distribuição e criou bases exteriores estáveis (que marcam a diferença entre quem apenas “exporta” e quem se “internacionaliza”). Casos de sucesso como a Compal, a Renova, a Sovena, a Outsystems, a WEDO, a Sacoor, a Delta, a TIMWE ou a Fly London estão aí para o demonstrar.
Como fazer e multiplicar? Primeiro é necessário, como em qualquer agenda empresarial, Visão (saber onde queremos chegar), Estratégia (o caminho a trilhar) e Liderança (mobilizar pessoas e fazer as coisas acontecer). Depois, há que desenvolver uma análise estratégica (stakeholders locais, processos, legislação, oportunidades, idiossincrasias e variáveis culturais nacionais e regionais) acerca do meio em que nos pretendemos inserir. Tudo isto implica a adaptação a culturas e mercados diferentes, sabendo que existe tempo de semear e tempo de colher. Depois, pela minha experiência, o capital humano é um factor crítico de sucesso. Em concreto, considero mandatório o desenvolvimento de três competências-chave nas empresas que se queiram internacionalizar e adquirir uma essência verdadeiramente global:
- Orientação à mudança e inovação – capacidade de, com proactividade, equacionar novos modelos de negócio, novos processos de trabalho, novos canais de distribuição; ser empreendedor, percepcionando oportunidades e estabelecendo um grau de aceitação do risco, baseado numa boa análise da realidade.
- Resiliência – a capacidade de resistirmos à pressão e ao choque inicial, ao (provável) desconforto físico e emocional; há que preparar as pessoas em vias de expatriação ou missões internacionais mais prolongadas para este percurso, o qual nunca é fácil.
- Gestão Intercultural – capacidade de conhecer, interpretar e agir sobre diferentes realidades culturais e nacionais; de forma simples, compreender atitudes e comportamentos inerentes aos contextos sociais, históricos ou geográficos; perceber as influências culturais em variáveis comportamentais como autonomia vs. centralização ou formalismo vs. informalidade; ou como algumas culturas valorizam o indivíduo, outras o colectivo; ou como se enquadra o tempo e como temos culturas mais “imediatistas” e outras orientadas para o longo prazo.
Aqui, e digo-o com convicção, o ADN do profissional português, aplicado em contextos multinacionais, é uma mais-valia. Temos uma capacidade de adaptação fantástica, somos muito orientados à inovação e à adoção de tecnologias, somos muito orientados à aprendizagem linguística. Somos imbatíveis no improviso, em trabalhar de forma flexível e polivalente, na gestão de crises. Precisamos de mais e melhores empresas verdadeiramente globais – baseadas na mobilidade do capital humano e na adopção de um modelo de organização adaptável, verdadeiramente transnacional.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.