De entre o conjunto alargado de riscos externos que podem afetar uma organização, os eventos pandémicos eram, até março deste ano, considerados pouco prováveis e, consequentemente, pouco importantes.
Com o surgimento e disseminação da Covid-19, e com a materialização das consequências associadas à pandemia, a necessidade de revisitar o mapa de riscos e os planos de mitigação tornou-se (mais) clara. Deu-se então a consciencialização de que, em muitos casos, os mapas estavam desatualizados e os planos incompletos, ou mesmo inexistentes. Assistimos, pois, a uma corrida à repescagem ou elaboração acelerada de planos de crise. Naturalmente que essa urgência resultou em iniciativas mais caras ou mesmo planos menos bem conseguidos.
Nos meses de março, abril, e maio, as empresas lutaram pela implementação de medidas de carácter imediato. Reconheceram a necessidade de investir em medidas estruturais, mas revelaram pouca capacidade – e vontade – de as materializar.
Ultrapassada a primeira vaga da pandemia, e sentidos os seus efeitos económicos em larga escala, as empresas são agora capazes de entender a necessária mudança de paradigma na forma de gerir o risco. Sobretudo quando atravessam já uma antecipada segunda vaga.
Enquanto processo continuado e sustentável, a gestão do risco tem vindo a crescer no seio das organizações. Muitas já têm os seus sistemas montados, ainda que de forma tímida ou anexada noutras funções. No entanto, a efetivação da gestão do risco ao nível da Administração tem ainda um caminho a percorrer. Assegurar a elaboração de um plano a cada 3/5 anos (que muitas vezes acaba por não ser implementado) ou analisar trimestralmente um conjunto de dashboards de Key Risk Indicators não são ferramentas suficientes. São bases necessárias, mas como todas as bases, servem para potenciar crescimento.
Neste caso, a ação passa por entrar no detalhe necessário do conhecimento dos riscos de negócio. Os administradores devem por isso, seja através de comités de risco, seja através dos diretores das suas áreas de negócio, seja através do próprio fluxo formal do processo de gestão do risco, conhecer os riscos relevantes. As suas fontes, as naturezas, e os potenciais impactos estimados. Só assim os riscos deixarão de ser expressões genéricas para se tornarem temas concretos, devidamente endereçados com ações estratégicas e operacionais.
O real envolvimento da gestão de topo na gestão do risco pressupõe ter o tema como ponto obrigatório nas agendas de todos as Administrações. Este novo paradigma de gestão permitirá analisar as tendências do negócio sob o prisma do risco, e fará com que a atuação sobre os riscos externos – sejam eles (vagas de) pandemias ou outros – seja muito mais fácil, flexível, e pervasiva na organização. Sendo maior o conhecimento sobre os riscos, também a preparação para a mitigação dos mesmos se torna mais robusta. Podemos esperar, portanto, planos de continuidade de negócios mais sólidos, mas também planos de atuação mais ágeis e eficazes no tratamento dos riscos operacionais, a todos os níveis.
Num contexto de incertezas, a certeza de que o risco existe é absoluta. 2020 materializou o risco pandémico, com impactos socioeconómicos severos. Os próximos anos serão pródigos em mudanças. As megatendências globais antecipam graves alterações climáticas, a superimposição da geração Z, e novos paradigmas da biotecnologia. São temas tão diversos quanto complexos. E que acarretam riscos muitíssimo relevantes para a sociedade em geral, e para as empresas em particular.
As empresas podem e devem, por isso, preparar-se para antecipar, gerir, e atuar de forma estruturada sobre estes riscos desde já, ganhando vantagens competitivas, e transformando-os mesmo em oportunidades de negócio.