“A História é uma velhota, que se repete sem cessar”, Eça de Queirós (1845-1900)

Diz o povo, na sua imensa sabedoria, que a “História sempre se repete”. De facto, e se formos analisar alguns sectores (particularmente a moda), verificamos que as tendências se repetem de forma cíclica, no entanto, é a inépcia, a incapacidade, a incompetência e a voracidade do Homem, que travam as necessárias inovações ou ajustamentos aos tempos em que vai vivendo. Outras vezes, é a constituição dos Homens que “não deixa” que se produzam alterações, perpetuando desmandos e atentados a um são desenvolvimento.

Vem isto a propósito de uma carta que o Infante D. Pedro, irmão do Infante D. Henrique e filho de D. João I e D. Filipa de Lencastre, escreveu a seu irmão D. Duarte, que sucedeu no trono ao seu pai D. João I.

D. Pedro viajou muito pela Europa, conheceu muito do que era a realidade política, cultural e social das cortes europeias da época. A carta que ficou conhecida como a Carta de Bruges, a qual resumia os grandes temas sociais e políticos, e as fortes indicações para transpor o imobilismo e a passividade e efectuar novas reformas, no sentido de ultrapassar as circunstâncias pontuais da administração pública e dos serviços públicos.

Sublinha a urgência de eliminar os parasitas que se adaptam a todos os governos e se consideram intocáveis, sobretudo por linhagem familiar ou imposições partidárias. Desta forma, D. Pedro incutia no irmão D. Duarte a necessidade em não hesitar em manter uma conduta de rectidão, coerência e, sobretudo, coragem moral e política.

Segundo D. Pedro, o governo do Estado deveria alicerçar-se em quatro pontos distintos e importantes: era preciso evitar o despovoamento, diminuindo os tributos que pesam sobre o povo; medidas que garantam um salário fixo e decente, cuja finalidade seria a de evitar os abusos que são cometidos para assegurar a subsistência; o número exagerado das pessoas que fazem parte da Casa do Rei e dos príncipes, de onde decorrem despesas exageradas que recaem sobre o povo, sobre a forma de impostos, acrescentando, que toda a gente ambiciona viver na Corte, sem que se lhe conheça outra actividade.

Por último, a justiça. Escrevia ele para o seu irmão, que a justiça tem duas partes: uma, é dar a cada um o que é seu; a outra refere-se àqueles que tarde vencem… ficam vencidos.

Decorridos que estão quase 600 anos sobre a Carta de Bruges (1426), e analisando a realidade portuguesa de hoje, percebemos que os seus objectivos continuam por cumprir. O que está em crise há alguns séculos é o português. O nosso grande mal é uma doença de vontade, o desalento, o pessimismo, o abandono fatalista, uma inerte cobardia e a falta de confiança no esforço próprio.

Muito se em falado da falta de políticos de qualidade em Portugal (e na Europa também), que possam ter a visão estratégica e o golpe de asa para conseguirem guindar o país a um patamar de abundância, de respeito cívico, de desenvolvimento, de cidadania e urbanidade, onde não exista espaço para os vícios da rotina, o favoritismo descarado, a subserviência política, os vespeiros da intriga, a corrupção generalizada, a lentidão da justiça, de tudo quanto tem impedido um projecto para Portugal voltado para o futuro.

Tudo isto não se resolve por Decreto. Resolve-se com uma regeneração de mentalidades e de ADN. Para tal, a Educação tem um papel essencial e maximizador. Caso não tenhamos a capacidade para alcançar essa regeneração, estaremos condenados a mais 600 anos de escaras sociais, lama, opacidade e um duro sofrimento, sobretudo por aqueles que “não frequentam a Corte ou os corredores do Poder”.