Diz a história que Bill Clinton tinha um problema: dos 100 conselheiros militares que ele tinha, um era pró-líbio e ele não sabia qual era. Mas Boris Yeltsin tinha um problema maior: tinha 100 conselheiros económicos, um deles era bom, e ele não sabia qual era. Vivemos tempos semelhantes, com dez cenários e 50 modelos económicos, mas não sabemos quais deles são os bons.

Temos hoje as taxas de inflação mais altas de mais de três décadas, ao mesmo tempo que temos políticas monetária e fiscal expansionistas. É caso para dizer vade retro, Satanás. E a coisa não abranda.

O défice orçamental francês em 2022 está previsto ao nível do PIB português. Parece muito, mas o britânico foi de 15% do PIB, vez e meia o nosso PIB, e será mais de 8% em 2022. A Alemanha, como sempre, será parcimoniosa, 4% este ano e 3,5% em 2022, mas é o país do quase eterno excedente. A Itália terá um défice este ano de mais de 150 mil milhões de euros (três quartos do nosso PIB), a ser reduzido para o ano de 9,5% do PIB para 5%.

Damos este “empurrão” à economia quando a inflação europeia está ao mais alto nível desde 1997, quando começaram os novos registos. Na zona euro corre (é o termo) a 4,5% previstos para novembro, com 6% na Alemanha. Do outro lado do Atlântico a situação não é diferente: nos EUA a inflação atingiu 6,2% em outubro (média anual), o valor mais alto desde novembro de 1990. No Canadá é 4,7%. Passando à Ásia, na China os preços no produtor subiam em outubro a 13,5% e no Japão tiveram o crescimento mais rápido em 40 anos. É outro aquecimento global.

Enquanto tudo isto se passa, a Fed e o BCE tocam violino. O BCE, em particular, diz que para já não vai iniciar o phasing out das injeções monetárias mensais e não aumenta as taxas de juro antes de 2023. Acreditam que os aumentos de preços são transitórios, fruto de circunstâncias de curto prazo, o que Mervyn King, anterior governador do Banco de Inglaterra, chamou a política monetária do Rei Canuto, que se sentou em frente do oceano e mandou as águas não subir. Ou seja, procrastinar.

É verdade que a variante Ómicron veio complicar as contas: se está para durar, é cedo para retirar os estímulos, sob risco de sermos apanhados em contrapé com novos confinamentos a obrigarem a novo suporte económico quando estivermos a eliminar tais medidas. Mas se (ou quando) a situação melhorar, o que seria o desfazer gradual do Quantitative Easing transforma-se em inflação persistente, com uma subida precipitada da taxa de juro.

Em suma, ou perdemos porque a Covid voltou, ou perdemos se ela não voltar por adiar, desfazer o que só a Covid justifica.

Ao apostar num único cenário, de forma desequilibrada e ignorando a evidência, os banqueiros centrais estão a tornar-se no que já foi qualificado como jogadores, mas não é verdade. Um jogador, se perder, perde o seu dinheiro.