Em Portugal estamos mais do que habituados às maiores piruetas políticas, pelo que a súbita mudança de sentido de voto de dois dos partidos que encabeçaram a mais estranha coligação de sempre não tem sequer o condão de nos fazer estremecer. O país ficou mais descansado, perante a invocação de que não havia dinheiro para pagar aos professores, sem que se erga a voz perante os vários milhões que somos chamados a largar nos verdadeiros buracos negros em que se transformaram os bancos, seja ele o Novo Banco (relembre-se, o que nos foi anunciado ser o “banco bom”), no BPN, no BANIF ou na Caixa.

Ainda assim, fomos completamente surpreendidos pela prestação de Joe Berardo, ilustre Comendador, no Parlamento. No meu caso, nem tanto pelo exacto montante da dívida ou pela falta de prestação de quaisquer garantias, quanto pela sua “magnífica” prestação na Comissão de Inquérito, onde, para além da manifesta falta de educação, revelou uma lata inacreditável. Berardo, cuja casa de banho se tornou assunto público, honra lhe seja feita, teve o condão de demonstrar que a Caixa Geral de Depósitos foi um esgoto a céu aberto, sendo que a nós nos foi reservado o papel de pagadores da limpeza do que sobra, isto é, no limite de autoclismo das suas aventuras financeiras.

Perante o total dislate que aquilo foi lamento, acima de tudo, que o senhor não tenha sido efectivamente posto na ordem. Um Parlamento que não se dá ao respeito perante pessoas daquele calibre não tem legitimidade para o exigir aos cumpridores. O que, contudo, me parece inaceitável é a impassividade de todos perante o que ali foi dito, ressalvado o choque inicial do único activismo de que somos capazes, ou seja, o do sofá.

Para além da tão portuguesa revolta nas redes sociais, não se conhece até agora uma verdadeira e adequada medida tendente a cobrar os milhões que aquela alminha, revelando, nas suas palavras, um espírito de “grande ajuda à banca”, deixou por pagar. Do mesmo modo, não existe nota que a Caixa Geral de Depósitos tenha  sequer tentado reagir contra os que, pelo seu punho, autorizaram os ditos empréstimos em moldes que nunca seriam aceites a um comum mortal, em sucessivas administrações cujos nomes não são conhecidos pela sua experiência bancária.

De facto, como a publicidade da própria há uns anos anunciava, há muito mais na caixa do que nós imaginamos. Infelizmente para o comum cidadão, não é bom. A questão, parece-me, não é termos consciência disso mas o que faremos com essa informação. Pessoalmente, pagar por pagar, prefiro de longe a antiguidade dos professores ou de qualquer trabalhador que tenha desempenhado as funções para que foi contratado com o mínimo de lealdade, o que é mais do que se pode dizer de quem aprovou aqueles créditos.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.