Se a campanha eleitoral viesse a seguir os princípios deste período de pré-campanha, no qual os debates têm estado a despertar o interesse de uma quantidade apreciável de cidadãos (cerca de dois milhões e 700 mil portugueses assistiram ao frente a frente entre António Costa e Rui Rio), poderia dizer-se, enfim, que os partidos estariam a ganhar juízo. Mas convém não deitar foguetes antes de tempo, ou seja, antes dos partidos lançarem os seus dirigentes nas habituais arruadas, visitas a praças e vendas de legumes, onde debitam banalidades sem fim, diminuindo-se pessoalmente e constrangendo a maioria dos eleitores.

Este período foi mais positivo do que era habitual e permite retirar algumas conclusões.

A primeira é que o crescimento do PAN influenciou o debate. Novos temas foram colocados definitivamente na agenda, relativos ao ambiente, aos consumos alimentares, à sustentabilidade energética e à relação homem-animal, entre outros. Para além disso, a colocação do PAN no centro do espectro político permite adivinhar novas possibilidades de alianças de poder, seja a curto prazo (com o PS) ou a médio-longo (com várias outras forças partidárias, tanto à esquerda como à direita).

O Bloco de Esquerda foi o primeiro partido a adaptar-se às circunstâncias. Catarina Martins agarrou o ambiente como antes as chamadas ‘causas fraturantes’. O BE adora as discussões ‘da moda’ e percebe como elas interessam ao seu eleitor habitual, citadino, sofisticado e já menos mobilizável pela dialética do trabalho versus capital.

O PS teria na discussão sobre o fenómeno da corrupção o seu ponto mais vulnerável. António Costa antecipou-se, por isso, ao problema, com a habitual habilidade política. Reclamou iniciativas para o futuro e contou com a ‘colaboração’ de Rui Rio, cuja obsessão pelo funcionamento corporativo da Justiça o inibe, e ao PSD, de se centrar na questão de fundo.

Ainda assim, o debate dos seis líderes travado no ambiente rádio trouxe, finalmente, a temática da corrupção para o plano central, que deveria ocupar sempre nas discussões políticas nacionais. Não é por evitar o tema que se convence o país de que a corrupção não existe, como se pode testemunhar pela demissão do secretário de Estado da Proteção Civil, apenas o último caso de uma interminável lista que ilustra os últimos quatro penosos anos da nossa vida pública.

Outra conclusão a tirar, sem necessidade de sondagens, é a do definhamento do CDS. Assunção Cristas não consegue marcar a agenda. Entra discreta e sai irrelevante. Hoje, tanto Catarina Martins como André Silva lhe ganham, tanto pela força pessoal como pela importância dos temas que debatem. E, provavelmente, também estaremos a assistir à última campanha de Jerónimo de Sousa. O homem que ressuscitou o PCP, depois de Carlos Carvalhas, foi demasiado desgastado pela ‘geringonça’. Aliás, fica a lição: sempre que se alia ao PS, o PCP perde. Já foi assim depois da coligação em Lisboa nos anos 80 do século passado. Voltaremos a ver os comunistas na oposição pura e dura depois das eleições de outubro.

Há ideias, e pessoas, muito interessantes na Iniciativa Liberal e no Livre, bem mais jovens do que a velha Aliança de Santana Lopes, um projeto pessoal sem capacidade para mobilizar.

Volto a Rui Rio para uma constatação: é o único primeiro-ministro alternativo a António Costa. Provou-o no debate a dois e a falar do modelo que propõe para o desenvolvimento económico do país, com menos Estado, menos impostos e mais exportações. Provavelmente, não foi ouvido. Portugal ainda agradece à ‘geringonça’ a devolução mais rápida das regalias retiradas pela austeridade da troika. A questão para Rui Rio é escapar aos famintos deserdados do PSD que o confrontarão com os resultados, quaisquer que sejam. Fosse ele mais político e menos obcecado pelas convicções e talvez estivesse melhor. Mas não serei eu a criticá-lo por isso.