Na capital de Cabo Verde os lugares, os lugares onde estão sediadas as maiores embaixadas dos países acreditados no arquipélago da morabeza constituem um excelente exercício de reflexão histórico-estratégica. Assim, em frente ao majestoso e moderno Palácio da Assembleia Nacional, ficam as embaixadas de Espanha, Rússia, China e Portugal, todas elas com direito a ocupar um enorme espaço.

Uma localização que, à primeira vista, parece contraditória pelo menos em dois casos. Na verdade, foi a Rússia, então ainda a liderar a URSS e o Bloco de Leste, que apoiou a luta de libertação conjunta da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, que integravam o império colonial português. No entanto, como Espanha e a República Popular da China não tiveram um papel ativo no processo, não é a fase de luta independentista que pode ser vista como a razão explicativa.

Afinal, a localização das embaixadas decorre de outros fatores. No caso português, prende-se com a forma como Portugal valorizou os cabo-verdianos relativamente aos outros povos. Basta ver a quantidade de quadros com origem em Cabo Verde que foram colocados em posições de liderança um pouco por todo o império, inclusivamente na metrópole. Uma atitude que ajuda a explicar o bom relacionamento pós-independência e a dimensão da diáspora cabo-verdiana em Portugal.

Quanto a Espanha, é altamente duvidoso que a sua cooperação com Cabo Verde seja apenas motivada pelo desejo de estreitar as relações com uma das suas partes insulares.

Relativamente à Rússia e à China, a sua afirmação através da embaixada tem a ver com a globalização e a atual ordem mundial. Ficar junto ao Parlamento garante uma visibilidade suscetível de vir a gerar frutos. Sobretudo se essa localização for acompanhada de outras escolhas seletivas. Não deve ter sido por acaso que o capital chinês com base em Macau já adquiriu o ilhéu onde funcionou uma prisão para aí instalar um casino. Um país apostado em construir pontes interesseiras já ligou o ilhéu à terra. Tal como assumiu a responsabilidade pela construção da nova universidade a caminho da Cidade Velha.

E, perante este cenário, qual foi a reação dos Estados Unidos da América? A administração Trump teve em conta a posição geoestratégica privilegiada de Cabo Verde e decidiu recolocar a sua embaixada na capital do arquipélago. Para o efeito, optou por sair do Plateau, a parte da cidade popularmente designada por Chinatown, tal a profusão de lojas chinesas onde o cheiro a plástico com toques de petróleo não engana.

Os norte-americanos vão abandonar o Plateau, apesar de aí estar localizado o Palácio Presidencial. Um palácio que não ostenta grande brilho, mas que não deixa de ser a residência do Presidente da República. A nova e imponente embaixada dos EUA desceu no terreno para subir em importância. Por isso, vai ser construída quase nas traseiras do Palácio do Governo.

Uma mudança a que dificilmente será alheia a celebração do recente acordo militar – SOFA –  entre os EUA e Cabo Verde. O soft power da geopolítica e da geoestratégia no seu melhor. A exemplo da decisão russa de eliminar os vistos com o arquipélago.

Oxalá Cabo Verde saiba tirar pleno proveito do seu poder funcional e não siga o mau exemplo de Portugal no que aos Açores diz respeito.