Fabrizio Esposito é professor auxiliar de Direito Privado na Nova School of Law, onde coordena, com a professora Athina Sachoulidou, o mestrado em Direito – Especialização em Direito Empresarial e Tecnologia (“Law & Tech”). Em entrevista, analisa o impacto da tecnologia na advocacia.
A tecnologia vai mudar a forma como as sociedades de advogados trabalham, ou essas mudanças serão superficiais e a essência da atividade vai permanecer a mesma?
Num futuro previsível, acredito que a cognição humana permanecerá no centro da prática jurídica e do sistema jurídico em geral. Ao mesmo tempo, a tecnologia ajudará os escritórios de advocacia a tornarem-se prestadores de serviços mais eficazes. Pense-se na invenção dos computadores (e, antes disso, na máquina de escrever) ou no acesso à informação online. Todos eles transformaram a prática jurídica sem qualquer “mudança de paradigma”. Eu diria até que tornaram os advogados smarter; num futuro próximo, podemos esperar que os advogados fiquem ainda mais “atualizados”.
Pode dar-nos alguns exemplos de como a tecnologia vai ter impacto na forma como os advogados trabalham?
Penso que a mudança mais significativa que podemos esperar num futuro próximo é uma mudança na forma como muitos serviços jurídicos são pagos, desde a hora faturável pelo trabalho com taxas fixas. A razão pela qual o afirmo é que os escritórios de advocacia smart obterão uma visão fiável do custo da prestação dos seus serviços; além disso, várias tarefas morosas tornar-se-ão cada vez mais rápidas e padronizadas graças à tecnologia. Uma taxa fixa é uma excelente forma de assinalar a confiança de um escritório de advocacia na sua compreensão da tarefa em questão e de tranquilizar os clientes quanto à acessibilidade do serviço.
Os advogados do futuro terão de aprender mais sobre tecnologia? E se sim, as escolas de Direito portuguesas estão preparadas para isso?
Absolutamente. O advogado do futuro (próximo) terá que ser capaz de usar a tecnologia regularmente. Mas não ficará por aí, é evidente. Aconselhar clientes, reivindicar os seus direitos e proteger os seus interesses exigirá que os advogados sejam pelo menos fluentes nas tecnologias em causa. Isto não é uma novidade: os melhores advogados de Direito Civil, Comercial ou Família têm conhecimentos suficientes acerca das interações humanas para fazer as perguntas certas e procurar o aconselhamento de especialistas quando necessário.
Aqui, concordo que as faculdades de Direito e as universidades em geral são atores-chave. A Nova School of Law é líder nesta área. Levamos a tecnologia muito a sério e a resposta que temos recebido dos alunos deixa-me muito orgulhoso. Oferecemos o único curso de Direito e Tecnologia em Portugal ao nível da licenciatura e a nossa especialização em Direito Empresarial e Tecnologia é um sucesso notável; e temos planos para o futuro – fiquem atentos.
O desafio é que a “obsolescência” de um currículo jurídico nesta área é rápida. A tecnologia evolui constantemente e o Direito tenta acompanhar. A única maneira de não ficar à margem é um corpo docente e uma faculdade dedicados. A Nova School of Law tem vindo a contratar nesta área há alguns anos e continuará a fazê-lo no futuro próximo. Ao mesmo tempo, estar constantemente em busca da construção de pontes entre a comunidade jurídica e tecnológica e a alcançar o público em geral. Além disso, tem uma longa tradição em dar voz e atenção aos seus alunos de Mestrado e Doutoramento; a tecnologia é particularmente adequada à prossecução desse fim. Os nossos centros de conhecimento Data-driven Law e WhatNext.Law (em parceria com a VdA) são excelentes exemplos disso.
Acredita que os contratos inteligentes (smart contracts) vão ser uma realidade?
O contrato “smart” encontrará cada vez mais espaço em modelos de negócios de sucesso. Por exemplo, a cobrança de royalties é uma área em que os contratos “smart” oferecem muito potencial. Pessoalmente, espero que sejam usados também para fins regulatórios em benefício das partes mais fracas nos contratos. Por exemplo, poderíamos receber automaticamente uma compensação por atrasos e cancelamentos de voos de acordo com um Regulamento de Direitos dos Passageiros Aéreos alterado, em vez de depender da boa vontade das transportadoras aéreas.
Nesse contexto, sem dúvida, os advogados que elaboram e litigam contratos terão de, tal como mencionei antes, compreender suficientemente o conceito e a estrutura dos contratos “smart”, de modo a poderem fazer as perguntas certas e procurar o aconselhamento de especialistas quando necessário. Idealmente, os escritórios de advocacia terão a experiência interna para redigir e auditar contratos “smart”. Ao mesmo tempo, não sobrevalorizemos o contrato “smart” nem fiquemos demasiado entusiasmados com ele. Uma cooperação bem-sucedida e de longo prazo requer uma gestão conjunta dos problemas que surgem ao longo do caminho; os contratos “smart”, por si só, não são um bom substituto.
E como fica, nesta nova realidade, a ‘velha’ argumentação jurídica?
Na maioria das vezes, a tecnologia permite simplesmente que os processos existentes se tornem mais “granulares”. A publicidade e os preços personalizados são exemplos disso. Para a prática jurídica, tal significa maior confiança em princípios jurídicos e considerações sistemáticas para aplicar antigas disposições a uma nova realidade. Assim, estudar a tecnologia deve andar de mãos dadas com o domínio das ferramentas tradicionais de raciocínio e argumentação jurídica.
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