Dia 29 de Janeiro 2025, Ursula von der Leyen apresentou, em Bruxelas, aquilo a que chamou de “Bússola para a Competitividade” da economia europeia. Desconhece-se, contudo, se “a bússola” terá sido sujeita a calibração e passado no crivo das normas de certificação, ou seja, se reúne as condições mínimas para ter impacto futuro! Disso, falaremos adiante.

Passou foi ao lado de tema escaldante: a denúncia, em jornais europeus de vários países, pelo menos desde 23 do mês de Janeiro, de desvios de fundos comunitários para lóbis ambientais, ONG, com a finalidade de influenciar decisões e apoios a favor do “pacto verde europeu”, apresentado em Julho 2021 pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

O caso foi desencadeado pelas questões colocadas por Dirk Gotink, eurodeputado dos Países Baixos, membro do PPE. Até uma lista de “Membros a influenciar” foi encontrada, onde se mencionavam entidades a contactar para “tão nobres” missões lobistas!

Sobre esta investigação em curso, o novo Comissário para o Orçamento, o polaco Piotr Serafin, reconheceu os factos perante o PE.

Segundo o jornal mais lido dos Países Baixos, “DeTelegraaf”, a Comissão Europeia financiou, indiretamente, lóbis ligados ao ambiente para promover as suas políticas verdes, sendo muito activo nessas funções o ex-comissário Frans Timmermans.

O jornal francês “Le Point” denuncia que a Comissão atribuiu, a ONG do ambiente, fundos comunitários para promover junto de instituições e deputados o seu “pacto verde”, o programa europeu para a transição ecológica. Na Comissão de Controlo de Orçamento da UE terão soado campainhas de alarme que a levaram a divulgar documentos sobre o assunto.

Mas muitos outros meios de comunicação europeus, a que não ficou alheia a vizinha Espanha, abordaram o tema dos referidos desvios de fundos públicos, com títulos deveras escaldantes: novo escândalo de corrupção em Bruxelas; ingerências ideológicas verdes; Bruxelas sob o fogo de acusações de lobbying e ingerência; fundos comunitários desviados para influenciar o Acordo Verde da Comissão Europeia.

Todos os gostos têm o seu título.

Também é mencionado na comunicação social europeia que só, no ano 2024, foram consumidos 15 milhões de euros nesta promoção, tendo a ONG “Friends of the Earth Europe” recebido cerca de 1,5 milhões de euros da Comissão para desenvolver esse trabalho de convencimento sobre a “bondade” do pacto. Trata-se de uma ONG claramente antinuclear, um lóbi ao serviço das renováveis.

As consequências deste novo escândalo só vêm contribuir para o desprestígio da Comissão em políticas importantes, designadamente as relacionadas com o mundo agrícola que tanto tem contestado o pacto verde, um dos eixos centrais do programa da anterior Comissão.

A “Bússola” de von der Leyen

Para Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão, “chegou o momento de agir” para elevar e tornar competitiva a economia europeia, sobretudo através de um “choque de simplificação” administrativa da máquina da União Europeia. Falou da necessidade de simplificar e reduzir a carga administrativa para um conjunto de directivas e regulamentos, mas as estratégias e as ferramentas de comando pecaram por ausência. Por outro lado, repetiu um rol de boas intenções, diminuir custos da energia, promover projectos de interesse europeu e investimentos em tecnologias avançadas e inovação.

A Bússola para a Competitividade, embora aproveitando recomendações positivas do relatório Draghi, dando muita ênfase às palavras e frases que empregou, soou a instrumento algo empanado. Há quem refira que se trata de um roteiro.  Mas não passou dum roteiro de finalidades vagas, sem apontar os meios e os caminhos de as atingir.

Falta à Bússola da Comissão Europeia um novo modelo de desenvolvimento da economia e consensos em domínios-base como na energia e aprofundamento das componentes do mercado único lançado por Jacques Delors e uma leitura rigorosa do pouco progresso ou talvez fosse mais adequado falar de abandono desse caminho pelos sucessivos responsáveis da União Europeia. Sem um conhecimento do que se falhou e do porquê, não se avança, não se constrói estratégia sólida.

Draghi, no relatório, é muito claro sobre os montantes de financiamento/ano para montar a sua estratégia de competitividade e as potenciais fontes da sua obtenção. Von der Leyen, ao contrário, confirma apenas que vai avançar com a criação de um Fundo para a Competitividade. Sobre as fontes de financiamento diz pouco, apenas irá desviar fundos de outros departamentos dos planos comunitários e mobilizar investimentos privados, um trabalho a desenvolver pela Comissária portuguesa.

A grande mudança a este nível dependerá então da criação desse Fundo. Mais um.  Não estará a contradizer-se, acrescentando apenas mais burocracia? A bússola empenada resolve-se com tão “poucochinho” dinheiro?!

Depois, em domínios como a energia, sem dúvida, um buraco negro, a nível da UE, nada é dito sobre como proceder à redução dos custos energéticos ao nível da União, embora haja uma passagem onde refere que é preciso “agir com rapidez e unidade”.

O que tem feito a Comissão para gerar a unidade necessária, por exemplo, para construir uma política energética, quando estamos perante a Comissão Europeia mais sectária, neste domínio, com uma vice-presidente antinuclear, um comissário da energia, pior ainda, que já criou conflitos em reuniões do Conselho da Energia com representantes da França, defensor da energia nuclear e uma presidente pendente da posição da Alemanha. Onde está a unidade de acção? O mercado interno lançado por Delors, como antes se referiu e como diz Enrico Letta e, Draghi retoma, nunca foi completado e era fundamental para que o modelo europeu tivesse tido sucesso.

[Nota: defender a nuclear como fonte de energia limpa, bater-se para que a União Europeia pratique com esta fonte as regras praticadas com as outras, no mínimo em plano de igualdade, o que não tem sido seguido até à data, não implica ter de investir na energia nuclear. Implica não criar obstáculos a quem decida seguir esse caminho, hoje reconhecido como idóneo].

Como se pode avançar, então, com uma Bússola da Competitividade, digna desse nome, sem consenso em áreas fundamentais como energia, automóvel, mercado único e sem financiamento escalonado à altura que, a prazo, coloque a União Europeia no patamar Internacional que lhe interessa?

Falta tudo ou quase: modelo económico, vontade política, consensos e dirigentes à altura para tão importante tarefa. Mais uma vez, uma oportunidade adiada e nas condições actuais, a UE acossada por Trump pode vir a enfrentar uma situação difícil.

Termino a pensar em duas ideias criativas avançadas por Enrico Letta, em resposta a Trump: por que não a Europa aproximar-se de Pequim neste contexto?! E porque não hiper-tributar as grandes multinacionais americanas na Europa?

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.