A conjuntura externa e interna é o que é, condicionada que está por um primado da incerteza quer quanto aos fatores geopolíticos, quer quanto à evolução sustentada dos principais indicadores macroeconómicos.

Portugal, economia inserida na União Europeia (UE), é uma economia relativamente frágil, bastante endividada, com escassez óbvia de recursos, crescimentos económicos não pujantes, revelando uma omissão significativa na concretização de algumas reformas e, designadamente, as que têm a ver com o Estado Social.

A ansiada boa execução do vultuoso PRR – Plano de Recuperação e Resiliência não chega, obviamente, para tudo. Por muito que custe a alguns economistas, políticos e analistas-comentadores, há uma realidade que se me afigura estar a ser abordada no caminho certo. E ela traduz-se numa vigilância rigorosa com vista a que as contas públicas não derrapem, ainda que com “travão” de medidas mais amigas do desenvolvimento.

O que é pena, mas há que salvaguardar, em primeiro lugar, uma plataforma de combate à incerteza dos tempos de hoje. Ou seja: numa conjuntura que tem convivido com subidas significativas das taxas de juro – como uma consequência do combate à excessiva inflação – não há grandes margens para hesitações no que toca à salvaguarda da solidez de “almofadas financeiras” que visem conter os eventuais efeitos de uma turbulência dos mercados financeiros.

Sendo assim, numa altura em que o Governo de maioria absoluta tem deixado uma imagem de pouca eficácia e omissão no tratamento de questões de inegável importância, e quando os extremos políticos “afiam as facas” para, num futuro mais ou menos próximo, se colarem ao cerne da governação (pelo menos via acordos parlamentares em cada um dos espectros políticos), parece-me desejável que os partidos moderados ao centro consigam, num prazo relativamente breve, dentro do possível, entendimentos – mesmo que parciais – concretizados em legislação sobre áreas-chave da governação, como por exemplo a saúde, habitação, educação, segurança social e sistema de justiça.

Pelo menos estas, mas tal pressupõe humildade quer do Governo, quer da Oposição (e refiro-me, sobretudo, ao partido de alternância, o PSD) na procura de tais soluções. Nestes termos, seria beneficiado o PS ainda na sua governação e também o seria o PSD numa possível próxima governação ao confrontar-se (com a sua anuência) com questões importantes já arrumadas. Em suma, seria o país beneficiado, a meu ver.

Mas temo que isso não vá acontecer. Porque, pura e simplesmente, o relacionamento entre estes dois partidos centrais nasceu e cresceu num ambiente quase equivalente ao das rivalidades em clubes grandes de futebol, logo, num clima algo fanático.

Assim, quando se aproximar o fim do ciclo de poder – em que o PS, após sete anos, quase que “cederá” naturalmente a governação ao PSD (se este se afirmar eleitoralmente, claro) – será o próprio PS que começará a querer deixar mais marcas, típicas da esquerda, e será o PSD – na sua base histórica fortemente anti-comunista e, mesmo, anti-socialista – a não resistir a “cantos de sereia” mais direitistas, em nome da consolidação da tese de dois blocos políticos claramente opostos em termos da identidade esquerda-direita.

Teremos assim o “caldo entornado”, com óbvias repercussões na influência crescente de partidos mais extremados, apostando eu que tal não corresponde à vontade da maioria do eleitorado português. Com tudo isto, lá se vai a política de compromisso sonhada, se calhar ambiguamente, pelo Presidente da República e pelo primeiro-ministro em funções, se bem que nunca afirmada formalmente com ênfase.

Dito de outra forma: o centro político tenderá nos próximos debates ideológicos e eleitorais a ficar mais desprotegido, não trazendo nada de bom para enfrentar os desafios que o país continuará a ter pela frente. Mais desprotegido, sim, mas sempre decisivo!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.