A Venezuela tem estado no centro das preocupações do mundo. Desde o acesso ao poder do chavismo que este Estado se tornou o centro das atenções, em nome do equilíbrio de poder da América Latina. Outrora centro gerador de riqueza, na atualidade transformou-se em espaço de opressão, miséria e abandono.

Entre 1999 e 2014, com Hugo Chávez na presidência, lentamente o país considerado central foi-se afastando da democracia para construir uma oligarquia que se reclamava do socialismo e deste recebia o melhor acolhimento. A começar pelos seus parceiros portugueses no governo de Sócrates que alimentaram o regime e lhe proporcionaram reconhecimento e negócios, assentes em relações duvidosas e cinzentas com figuras próximas do poder.

O regime foi buscando ao longo dos anos uma legitimação populista, contornando a própria Constituição. Com a ascensão de Nicolás Maduro tornou-se ainda mais ditatorial, entrando progressivamente num declínio social e económico. A progressão do crime, o regresso da pobreza e da fome, a fuga das populações e a repressão constituem, desde 2014, a face mais visível da perda de qualidade de vida dos venezuelanos.

Existe uma extensa comunidade portuguesa na Venezuela, a maioria de segunda e terceira geração, que muito contribuiu para o desenvolvimento do país. Desde que a situação económica e social se começou a degradar, com sucessivos assaltos e ataques a estabelecimentos geridos por portugueses, que as autoridades nacionais adotaram uma atenção cuidada mas ponderada face às relações diplomáticas e à preocupação com os membros da comunidade portuguesa que ali resiste.

A situação política dá contudo sinais de crescente degradação. A vitória da oposição nas eleições legislativas em 2015 mereceu o desprezo democrático do regime, que reagiu com uma assembleia constituinte fantasma para se lhe contrapor. E quando a oposição invocou fraude eleitoral na reeleição de Maduro, e a esmagadora maioria da comunidade internacional o assumiu, o poder instalado aumentou a repressão sobre políticos e vociferou contra todos.

O posicionamento estratégico da Venezuela é vital para a estabilidade da América Latina. Em comunhão de interesses com os países vizinhos, como a Colômbia e o Equador, se constroem as áreas de influência por todo o continente. Por isso releva a construção de um espaço de democracia e de regresso à estabilidade social e económica.

O recente episódio em que Portugal se viu envolvido é apenas mais um episódio caricato da fraqueza do poder. A encenação sobre Juan Guaidó, pressionando todos os que o rodeiam e sancionando a TAP porque alegadamente esta teria permitido o transporte de explosivos, assume um quadro de caricatura de Estado, gravemente praticado pelo presidente da Assembleia Constituinte.

A alegação de que Portugal se assume como um país imperialista cai por natureza, mas permite avaliar a forma como os responsáveis venezuelanos usam argumentos para criar fatores de diversão e confusão para condicionar as relações entre Estados. Portugal tem assumido uma posição firme na relação recente com a Venezuela, exigindo a par da maioria dos estados europeus que a democracia seja reposta.

Quem usa argumentos do século XVIII tem uma capacidade política retrógrada própria de um passado de grilhetas e obscurantismo. Perante a atitude deste responsável, a posição do Governo português deve ser de intransigência e firmeza. Firme perante o disparate e intransigente na defesa da comunidade portuguesa e do regresso à democracia.