Tradicionalmente, desde que a democracia foi implantada que a semana entre as comemorações do 25 de abril e do 1º de Maio constitui um período de exaltação do movimento dos capitães e da Constituição de 1976 e dos direitos adquiridos. É também a oportunidade para reforçar a pressão sobre o regime para não defraudar a esperança diária dos portugueses de que valeu, e vale, a pena lutar.
Estes quarenta e sete anos equivalem em tempo à duração do Estado Novo e a comparação será inevitável, agora que novos movimentos questionam e tentam desvalorizar tudo o que foi ganho desde a revolução.
Esta reflexão anual conduz-nos a momentos eletrizantes da história recente, o primeiro 1º de Maio, a tomada de poder comunista no 11 de Março e as nacionalizações, a reversão do 25 de novembro e o despontar de Ramalho Eanes que mantém um percurso de serenidade ponderada, assistindo de longe aos protagonistas seguintes, do projeto único e inolvidável de Francisco Sá Carneiro, o percurso duradouro de Mário Soares, as maiorias absolutas de Cavaco Silva, a ascensão de protagonistas portugueses à dimensão internacional como Durão Barroso e António Guterres. Ou a visão negra de um consulado de Sócrates e a missão de sacrifício para retomar o caminho da normalidade de Pedro Passos Coelho.
Ao longo de todo este tempo de democracia, variaram as maiorias, reverteram-se as perspetivas, mudaram as perceções políticas do povo e das elites, com insatisfações múltiplas e desesperanças várias, muitas vezes geradas por ilusões alimentadas pelo marketing e não pela realidade.
Hoje, as liberdades encontram-se consolidadas, os direitos individuais garantidos e o sistema político resiliente, dispondo de oportunidades suficientes que permitem o equilíbrio e a sucessiva mudança de protagonistas recriando aberturas que conduzem à participação e à busca de novas respostas.
Esta época, antes marcada por manifestações de rua e privilégios de esquerda é, por ora, uma oportunidade de apelo à afinação de práticas. O 25 de Abril não é da esquerda, nem o antissistema é património da direita. Entre extremos existe todo o espaço para promover a satisfação generalizada. A responsabilidade está em quem governa, em saber ouvir, saber decidir e conseguir acertar. Nem sempre o alcança porque, muitas vezes, o poder é cego, surdo e mudo, e decide erradamente.
A democracia não está doente, mas não está livre das maçãs podres. As democracias estão cheias de oportunistas que usam as brechas para obter benefícios a que não têm direito. Não são falhas do regime, mas abusos que têm de ser punidos. A insatisfação deriva da insuficiência económica. É uma das falhas da democracia. A pobreza que grassa, mesmo a encapotada, tem de ser combatida pela criação de riqueza e não pela dependência pública, que deve ser recorrente.
Falta realizar a democracia das oportunidades. Onde se exige ambição e igualdade de acesso para construir um modelo reabilitado da democracia. Que olha para o país e povo de forma igual e não para o Estado omnipresente.