(Fui em cada minuto dos seus mandatos opositora de Elina Fraga, como já o era de Marinho Pinto. Não critiquei apenas o carácter populista das intervenções de ambos como, acima de tudo, um desnorte financeiro que parecia andar a par e passo com o do país. Estou, portanto, à-vontade para falar, não apenas do passado recente como do presente, convencida de que foi, de facto, preciso mudar algo para que muita coisa permanecesse na mesma.)
Numa semana profícua em notícias para humoristas, destaco o que, para mim, é uma não-notícia, na medida em que já há mais de nove anos que vinha repetindo, mesmo sob ameaças várias, o que agora se tornou conhecido. Auditoria feita e resultados apenas parcialmente publicados, é para todos evidente que algo esteve profundamente errado na gestão dos dinheiros da Ordem. Independentemente do que se possa vir a apurar, o que causa perplexidade não são apenas os montantes envolvidos mas, acima de tudo, como foi possível tal descaminho durar tanto tempo numa instituição de interesse público.
Dito isto, o que não posso deixar de assinalar é o paradoxo de, pelo que se disse, o mesmo Bastonário – que foi eleito justamente como reacção ao dito desnorte – ter defendido em sede de Conselho Geral que, não obstante a gravidade do que afirmou ter sido apurado, o resultado da auditoria não deveria ser enviado às autoridades competentes. Esta posição, incompreensível para todos aqueles que pagam as suas quotas à Ordem no pressuposto de que o seu dinheiro é bem usado, incluindo-se aqui a própria auditoria, equivale a “varrer para debaixo do tapete” as responsabilidades e é quase tão inadmissível numa qualquer instituição de interesse público e, mais ainda, na Ordem dos Advogados quanto o alegado uso que foi dado ao dinheiro.
Um Bastonário que, sob a justificação de que o envio de uma auditoria para a Procuradoria, com o conteúdo que aquela tem, encerra um desprestígio evita o recurso à Justiça, é alguém que não pode representar todos os advogados por mais debates que protagonize sobre a delação premiada.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.