“It’s time to take out the trash”. Patrizia Reggiani, socialite e ex-mulher de Patrizio Gucci, condenada num julgamento altamente mediático pela contratação de um assassino profissional para matar o ex-marido Maurizio Gucci por rancor com disputas do divórcio e financeiras

A. A emergência do escândalo e as suas consequências

As empresas familiares desfrutam de vários atributos diferenciadores, nomeadamente a vantagem única de uma confiança enraizada entre acionistas e com a comunidade, valores partilhados ou estabilidade a longo prazo. Não obstante, as circunstâncias levam por vezes à rotura de relações no seio do foro acionista e, se o conflito escalar, rebenta o escândalo. Ninguém o quer, ninguém o procura, ninguém se protege, mas de repente estoira.

Várias razões podem originar escândalos numa empresa familiar – má gestão financeira, má conduta pessoal, desavenças com decisões de gestão ou suspeitas de favorecimento de descendentes por exemplo. E é quando a família já não consegue conter o problema no seu seio e que o público em geral se apercebendo que se passa que nasce o escândalo, afinal um conflito familiar bombástico espalhado por uma sociedade ávida de desastres dos ricos.

E as repercussões são naturalmente devastadoras – a erosão da confiança e da reputação, as inevitáveis repercussões financeiras, a erosão da liderança na empresa e na família, a alienação da próxima geração e de potenciais sucessores, a perda de moral e lealdade dos colaboradores levando à saída dos melhores e impossibilidade de contratar novo talento.

Há dezenas de casos de escândalos em empresas familiares, mas escolhi três dos mais agressivos e famosos que são paradigmáticos.

B. Escândalos famosos em grupos familiares

O caso Gucci Fundada por Guccio Gucci em 1906, são os seus filhos Aldo e Rodolfo que lançam a mística Gucci e elevam o negócio a um novo patamar. Mas a coesão no seio da família acionista foi sempre frágil, marcada por inúmeras desavenças que levaram a uma publicidade adversa considerável ao longo dos anos. O ódio culmina no assassinato do neto do fundador em 1995, dois anos depois de ser forçado a abandonar a presidência. A ex-esposa Patrizia Reggiani é condenada por organizar o assassinato por uma mistura de ciúmes, dinheiro e ressentimento em relação ao ex-marido. Divididos pelas amargas lutas pelo controlo de seu império, os membros da família acabam por perder tudo para a Kering. A empresa sobreviveu, a família não.

O caso Tanzi

Fundada em 1961 por Calisto Tanzi, a empresa familiar Parmalat torna-se um conglomerado multinacional com 214 subsidiárias em 48 países. Nos anos 80, Tanzi e o filho conduzem investimentos colossais em futebol partindo da compra do “seu” clube Parma para dominar uma constelação de clubes e jogadores – onde se inclui o Benfica. Quando o desempenho financeiro da empresa derrapa em 1990, Tanzi monta um esquema para disfarçar as contas da Parmalat. Ao longo dos 13 anos seguintes, inflaciona a receita, cria transações falsas e dupla faturação e oculta a dívida aos investidores. Em 2003 o esquema estoira: a Parmalat é entra em colapso, torna-se no maior escândalo de falência empresarial da Europa e Calisto Tanzi é condenado a 18 anos de prisão. Resgatada pelo Grupo Lactalis, a Parmalat volta a assumir-se como um colosso. A empresa sobreviveu, a família não.

O caso Bettencourt

Em 2007, Françoise Bettencourt Meyers, herdeira do império L’Oréal e neta do seu fundador, coloca em tribunal o fotógrafo François-Marie Banier alegando que se estava a aproveitar da mãe, Liliane Bettencourt, de 84 anos, uma das mulheres mais ricas do mundo. Esta guerra coloca a família sob os holofotes e descobre-se os favores e dinheiro a políticos franceses de topo, com destaque para François Sarkozy. Uma década mais tarde, Banier é condenado a três anos de prisão e a zanga entre mãe e filha manteve-se até à morte da mãe em 2017. Com uma marca poderosa, a empresa L’Oréal saiu ilesa do folhetim. Aqui, sobreviveram empresa e família.

C. Medidas de recuperação e mitigação dos efeitos sobre a empresa

Embora os escândalos possam ter efeitos devastadores, as empresas familiares não devem nunca ficar de braços cruzados a ver a empresa desmoronar-se. O que fazer?

O primeiro e mais crítico passo é a criar transparência, fomentando a confiança e assumindo o compromisso de corrigir os erros. A implementação de reformas de governação é outro passo crucial, eliminando o risco de tomada de decisões informais ou sem supervisão adequada. A gestão de reputação é normalmente incontornável, o que pode incluir rebranding, campanhas de relações públicas ou até mesmo mudar a liderança para distanciar a empresa dos envolvidos no escândalo. E finalmente as famílias devem abordar as suas próprias dinâmicas internas, assegurando que o que se passou não volta a acontecer, recorrendo a mediação externa para reconstruir a paz.

D. Para terminar num tom positivo…

Vimos que um escândalo pode ter gravíssimas consequências para uma empresa familiar, acabando muitas vezes com ela. A natureza destas empresas, em que o pessoal e o profissional estão muitas vezes profundamente interligados, torna-as particularmente vulneráveis. No entanto, embora o impacto de um escândalo possa ser devastador, não é o fim. Com transparência, governança forte e um compromisso de reconstruir a confiança, muitos casos mostram que a empresa pode reemergir ainda mais forte com um legado fortalecido, lançando-se num novo ciclo de valorização e crescimento.