No último domingo, Marcelo Rebelo de Sousa foi reeleito Presidente da República com mais de 60% dos votos expressos pelos portugueses. Os restantes sete candidatos dividiram entre si menos de 40% dos votos. É absolutamente bizarro falar de qualquer hipotética vitória, que não seja a do único vencedor, Marcelo Rebelo de Sousa.
Os pequenos candidatos de facção, que usam as eleições presidenciais e os recursos públicos para afirmação do grupo, ou caderno de encargos pessoal, podem, ou não, atingir os objectivos a que se propõem e as metas que assumem publicamente. Neste subcapítulo, todos falharam estrondosa e factualmente as suas metas, juntaram à clamorosa derrota na eleição em si, a derrota no campeonato dos pequeninos. Se há, ou não, lata suficiente para delírios em direcção diversa, depende só da relação de cada um com o sentido de ridículo.
A vitória de Marcelo Rebelo de Sousa é uma vitória que é apenas sua e das ideias com que se apresentou a votos. O PSD e o CDS apoiaram a sua candidatura, a meu ver bem. O PSD apoiou um seu antigo presidente e fundador, o CDS teve o testemunho de todos os presidentes vivos do partido e a legitimação deste apoio por mais de 70% do seu Conselho Nacional; em ambos os casos, aconteceu aquilo que é normal e expectável.
Apesar da vitória não ser dos partidos, é natural que haja nestes um sentido de regozijo e celebração, afinal, é um grande triunfo da área do centro e direita num tempo de domínio da esquerda e extrema-esquerda. É absolutamente normal que o apoiante rejubile com o triunfo do apoiado.
A reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa abre um desafio à direita que, não sendo novo, é reafirmado de forma a não poder ser ignorado. Existe muito a opinião generalizada de que Marcelo falou o menos possível na campanha. De facto, não perdeu tempo em fait divers, nem andou a reboque de agendas que não eram a sua, nem tinham peso para tal. Mas, ao contrário do que se diz, Marcelo disse o que era realmente importante dizer. A afirmação taxativa do seu enquadramento ideológico e da sua visão do mundo é o grande momento definidor da campanha.
De forma inequívoca e muito bem explicada, Marcelo afirmou-se como o candidato da direita social. Explicou de modo detalhado, para o tempo de que dispunha, o que entendia por direita social; um grande conceito que pode abranger a direita da social democracia, toda a democracia cristã e uma parte muito significativa dos conservadores. Marcelo sempre se guiou pela doutrina social da Igreja, e explicitou-o sem margem para dúvidas. Quem votou Marcelo, votou nestes princípios. Resta saber o que faz a direita partidária perante a capacidade desta ideia de direita, com o protagonista certo, colher a preferência de mais de 60% dos portugueses.
Marcelo provou que é possível, e que há um lugar vencedor para esta grande ideia de direita profundamente democrática. A outra ideia de direita democrática a jogo, mereceu a rejeição de 96,7% dos portugueses.
Costumo referir muito o caso alemão, um dos países mais desenvolvidos social e economicamente do mundo, como a prova de que a democracia cristã, ou se quisermos a direita social, fazem todo o sentido. Justiça social, riqueza, bem-estar, acolhimento do diferente e integração das minorias não são incompatíveis com segurança, crescimento económico, desenvolvimento industrial e cientifico. Aliás, o equilíbrio, o humanismo e o bom senso são as chaves do sucesso.
Estranhei muito, por isso, que a primeira preocupação de Rui Rio tenha sido afirmar de forma quase agressiva um corte ideológico com o Presidente, repetindo visceralmente que o seu PSD não é de direita, de nenhuma direita, que está rigorosamente ao centro. Sabemos que não é este o pensamento da maioria dos eleitores PSD, pelo que não se compreende esta obstinação de Rio em reescrever a história ideológica do partido e em ignorar o pensamento da sua base de apoio.
Francisco Rodrigues dos Santos tem sido leal à matriz fundacional do CDS e está por natureza na área que o Presidente levou ao triunfo, nunca tendo posto em causa a ideologia que sempre identificou o partido. As dificuldades que o CDS atravessa não têm a ver com ideologia, nem com propositura.
O PSD e o CDS juntos já tiveram maiorias absolutas, salvando Portugal das grandes tragédias socialistas. Marcelo Rebelo de Sousa maximizou a aceitação desse ideário, tornando-o atractivo a mais de 60% dos portugueses. Centralizar a discussão em fenómenos marginais e conjunturais mais ou menos democráticos, é falar da árvore em vez da floresta. A discussão e o desafio da direita democrática está aqui, nesta enorme maioria que está pronta a aderir às grandes linhas orientadoras do seu pensamento.
A história diz-nos que só com um PSD forte e um CDS simultaneamente forte, se reforma o país. Como ponto de partida, é preciso que cada um saiba primeiro onde está, só depois se poderá pensar em estar à altura da missão.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.