O dilema do prisioneiro é um problema muito popular da teoria dos jogos em que dois suspeitos de participaram num crime são presos e postos em duas celas separadas sem comunicação entre si. É feito um acordo com cada prisioneiro. Quem confessar sai em liberdade, ficando o parceiro com uma pena de dez anos. Se os dois confessarem, cada um terá uma pena de cinco anos. Os parceiros sabem que, se ninguém confessar, ficam dois anos presos.
A moral desta história é que cooperar é vantajoso. No entanto, se cada parceiro não confia inteiramente no outro, o melhor é confessar, reduzindo a pena para cinco anos.
Em resposta à invasão da Ucrânia pela Rússia, a União Europeia (UE) excluiu sete bancos russos do SWIFT, o sistema belga de pagamentos internacionais. Ficou refém da decisão de Putin já que, se não o fizesse, aos olhos do mundo estaria a compactuar com a sua escolha. Mas o prisioneiro UE não denunciou o jogo todo, mantendo no sistema de pagamentos dois bancos russos ligados às transações de gás e petróleo.
A UE depende da Rússia para obter estas matérias-primas estratégicas – importando 40% do seu gás natural e 25% do petróleo deste país – a sua relutância em impor sanções mais duras resultando de não se querer infligir uma maior punição. As alternativas ao fornecimento russo não são fáceis de encontrar e, a existirem, serão ainda mais caras, quando o preço destes bens está já em níveis estratosféricos.
Por muito espanto que esta atitude possa causar, não é inédita, nem para a Europa nem para o mundo. No livro “A Torre de Basileia”, Adam Lebor descreve como durante toda a Segunda Guerra Mundial o Banco de Pagamentos Internacionais (BIS) se manteve aberto, comandando de modo secreto as transações financeiras entre nações beligerantes, aceitando ouro nazi saqueado e assegurando a paz económica da Alemanha em 1945.
Para a UE, continuar a estabelecer trocas com a Rússia é uma escolha cooperativa, em que todos saem a ganhar. As discussões éticas far-se-ão terminada a guerra.
A dimensão da integração global salta à vista, na subida da inflação sentida desde o verão de 2021 ou no crescimento de 11,2% do SWIFT em 2021. Um novo pára-arranca da economia só acentuará mais os desequilíbrios instalados.
E a pressão para agir assim é ainda maior, quando um novo tabuleiro, oferecido pela China, se quer afirmar neste jogo. Sem rede, a Rússia será obrigada a procurar alternativas, por exemplo no sistema de pagamentos chinês, que tem potencial de crescimento e que desta forma poderá obter a escala de que necessita para se desenvolver (e, em janeiro de 2022, o yuan surgia já como a quarta moeda internacional). Convém também não esquecer o papel que poderão assumir as opacas criptomoedas, menos rastreáveis e, portanto, ligadas até a negócios mais dúbios.
As sanções visam dissuadir a guerra e são por isso importantes, mas o tabuleiro internacional não se resume a um simples dilema. Putin pode ser louco, ditador, ou outro epíteto. Pouco importa. Há muito que a globalização lançou os dados de um jogo onde as economias estão todas prisioneiras. Ou cooperam e todas ganham, ou vão ser forçadas a subir a parada para níveis que não conseguirão acompanhar.