A União Europeia já teve melhores dias. Nos últimos anos, assistimos à maior tensão entre Estados Membros desde a longínqua criação das Comunidades Europeias na década de 1950. A crise das dívidas soberanas em 2011 testou os limites da coesão entre os Estados e os resultados não foram animadores. A Grécia esteve por um fio. Criaram-se clivagens e divisões entre Estados, e surgiram acrónimos como “PIIGS” para desqualificar alguns deles. O Reino Unido está de saída. Muitos especialistas em assuntos europeus vaticinaram o fim do euro e, por arrasto, da União.

As coisas parecem ter melhorado. Mas talvez apenas transitoriamente. A vida em comum dos povos europeus, que o projeto das Comunidades Europeias começou por fomentar em nome da paz, pressupõe princípios comuns e laços que não é certo que existam ou que sejam fáceis de construir.  Vida em comum exige solidariedade. Solidariedade requer, por um lado, regras para limitar o risco moral e laços linguísticos ou culturais.

Comecemos pelo risco moral. Lembra-se do antigo presidente do Eurogrupo dizer que os países do Sul não podem gastar tudo em copos e mulheres e depois pedir ajuda? Embora se trate de uma frase politicamente lamentável, não deixa de caricaturar um problema identificado pela teoria económica e não muito distinto do que se coloca na vida das famílias. Se vamos viver em comum e posso ser chamado a pagar as tuas contas, quero assegurar-me de que és sensato nos gastos. Precisamos de regras.

Entre Estados que decidem ligar os seus destinos numa União política (e monetária), a situação não é diferente. Quando os países do Sul da Europa se viram em dificuldades e precisaram de ajuda, o tema da solidariedade entre países da União veio à tona. Apontaram-se dedos. Os do Sul falaram da conjuntura. Os do Norte falaram de copos e mulheres. Ficou bem claro que não há ajudas sem regras. Ajudo se foi a conjuntura. Não ajudo se foram maus gastos.

Quanto aos laços, a questão é mais complexa. De um modo geral, em todos os países umas regiões subsidiam outras. Em Portugal, por exemplo, o interior rural e as ilhas são financiados pela riqueza e pelos impostos gerados no litoral. Em Itália, o Norte financia o Sul. No Reino Unido são as regiões do Sul que financiam as do Norte.

Ninguém estranha. São os mesmos povos. A solidariedade raramente é posta em causa quando existe uma cultura comum, uma língua comum e um único povo. Quando assim não é, tudo pode ser mais complicado. Veja-se a Catalunha, que financia o resto de Espanha, ou a Flandres que transfere fundos para a Valónia.

A União Europeia vai ter que evoluir. Mas, para evoluir como projeto de vida em comum entre os seus Estados Membros, precisa de regras que eliminem a desconfiança e reforcem laços entre povos com culturas e idiomas diferentes.