Como acontece no início de cada ano, temos sido bombardeados com uma quantidade infindável de predições sobre o que deverá acontecer ao longo dos próximos meses. Tenho a sensação de que esta tendência para a adivinhação é crescente e afeta progressivamente um maior número de áreas, o que pode ser consequência dos tempos de maior incerteza geral que atravessamos, do impacto crescente da revolução digital em curso ou da necessidade de alimentar com conteúdos, embora superficiais, um número crescente de publicações de todo o tipo.
Esta propensão para fazer conjeturas sobre o amanhã, para o “achismo” generalizado, pode ser também consequência da necessidade de afirmar a prevalência humana e de proclamar o nosso aparente controlo sobre o futuro, como contraposição à proliferação de máquinas programadas com algoritmos progressivamente mais potentes, alimentadas com dados mais ricos e, portanto, com previsões tendencialmente mais exatas.
Mas uma interpretação menos benevolente desta epidemia preditiva apontaria para objetivos mais interessados, como a publicidade, a influência ou a manipulação.
A perspetiva publicitária, que associo, por exemplo, a empresas consultoras à procura de um impacto mediático, fomenta um tipo de predição adornado com a invenção de termos ocorrentes que procuram um impacto lexical que não conseguem no âmbito conceptual.
Quanto mais arriscadas e mais negativas forem as previsões, maior cobertura conseguem. A maior parte das opiniões sobre o impacto desastroso e aparentemente imediato de algumas tecnologias na atual ordem social é um exemplo desta aproximação. Muitas destas perceções negativas são alimentadas pela dificuldade de visionar o futuro, o que, conjugado com o nosso instinto de sobrevivência, nos empurra para antecipar os piores cenários.
Outro tipo de previsões visam influenciar comportamentos no âmbito económico, como a demonização da compra de automóveis a diesel, que provavelmente continuaremos a ver nas estradas durante as próximas décadas mas cujas vendas têm caído drasticamente perante o acosso preditivo a que tem sido recentemente submetida. Trata-se de profecias que fomentam o seu próprio cumprimento e que tentam criar tração social num determinado sentido.
Finalmente, reservei para a política o privilégio de se associar à dimensão manipulativa das predições, muitas vezes instrumentalizadas através de vagas generalizações que alavancam em sentimentos negativos para criar cenários catastrofistas associados, por exemplo, à imigração, e que tão bons réditos eleitorais têm proporcionado recentemente. A incerteza e o pessimismo, decorrentes também do envelhecimento da população, alavancam as predições negativas que contagiam os mais jovens. Já ouvi alguma das minhas filhas proclamar com convicção que o mundo deverá acabar cedo, perante essas previsões tão negativas com que estamos a ser bombardeados.
A maior parte das previsões são, no mínimo junk food, são fake news sobre o futuro. O mundo é extremamente complexo, mas adoramos as ideias simples porque preferimos sentir a pensar. E quem consegue controlar os nossos sentimentos, controla também o nosso futuro.