A notícia de que muitos jovens portugueses ponderam estudar ou trabalhar no estrangeiro traz, à primeira vista, preocupação. Todavia, esse movimento pode também ser encarado como a emergência de uma Geração Circulante: talentos que se qualificam fora e regressam com competências, redes e visão que podem impulsionar a economia nacional.
Segundo um estudo recente da Federação Académica do Porto (FAP), cerca de 73 % dos estudantes do ensino superior consideram altamente provável emigrar após a conclusão do curso, e aproximadamente 25 % já têm a decisão tomada. Esse fenómeno não é apenas social. O custo orçamental estimado é de 2,1 mil milhões de euros por ano, caso 320 mil jovens qualificados decidam emigrar ao longo da sua vida ativa. Numa projeção mais conservadora – para os cerca de 100 mil que já decidiram sair – a perda líquida ainda atinge cerca de mil milhões de euros por ano.
É evidente que a fuga de talento tem implicações macroeconómicas profundas. A saída de jovens qualificados reduz a capacidade produtiva do país, mina a geração de riqueza futura e agrava os desafios demográficos num país já marcado por um envelhecimento rápido. Segundo a Pordata, a população portuguesa está a envelhecer mais depressa do que em muitos outros estados da União Europeia (UE), o que deve implicar a definição de uma política ativa que inverta esta preocupante situação.
Todavia, nem tudo são más notícias: há um caminho estratégico para transformar esse fenómeno numa alavanca de crescimento. Quando estes jovens regressam – idealmente – trazem consigo capital de conhecimento (experiência em mercados mais maduros, melhores práticas organizacionais, cultura de inovação), capital social (redes internacionais) e uma mentalidade mais resiliente.
Nesse sentido, as políticas públicas têm já dado passos promissores. O Governo português – e muito bem! – propôs isenções progressivas de IRS para jovens até aos 35 anos, com isenção total no primeiro ano para rendimentos até 28.000 euros/ano. São medidas pensadas para tornar o regresso mais atrativo e rentável. No entanto, há também várias vozes críticas, que alertam para o elevado custo fiscal dessas isenções.
A aposta no regresso ao país só tem sentido se vier acompanhada por um ambiente económico favorável: um mercado de trabalho dinâmico, oportunidades em setores de elevado valor acrescentado e uma estrutura regulatória que estimule o empreendedorismo. Aqui, os hubs tecnológicos e as startups portuguesas – especialmente em Lisboa e no Porto – têm um papel central. Essas “âncoras” económicas podem absorver talento qualificado e oferecer projetos verdadeiramente ambiciosos.
Há ainda estudos que mostram o impacto potencial do regresso de talento na economia nacional. Uma análise da Business Roundtable Association e da Deloitte aponta que se cerca de 194 mil graduados que emigraram entre 2012 e 2021 voltassem, isso poderia gerar 1,6 mil milhões de euros em valor acrescentado bruto, o que corresponderia a um aumento de 0,65 pontos percentuais no crescimento do PIB. Esse impulso permitiria acelerar a convergência de Portugal com a média da UE, algo que só por si tem impacto relevante no longo prazo.
Além disso, a demografia torna esta estratégia ainda mais urgente: com um índice de envelhecimento elevado, os fluxos migratórios (tanto de saída como de entrada) têm um peso decisivo na sustentabilidade dos sistemas de segurança social. Um ponto importante que muitas vezes passa ao lado é o papel dos imigrantes em Portugal que contribuem de forma significativa para as contas públicas.
Tudo isso reforça a ideia de que a Geração Circulante não é um risco a temer, mas uma alavanca a potenciar. Se o regresso for bem desenhado – com políticas fiscais, ambientes empresariais inovadores e sinal claro de valorização –, esses jovens qualificados tornam-se um motor de crescimento estrutural. O desafio para Portugal é claro: não impedir que saiam, mas garantir que o bilhete de regresso é tão ou mais atrativo do que a partida.



