Se me perguntam, em tese geral, se gosto de greves, eu respondo que não. Prefiro negociações e entendimentos.

Se me perguntam se gosto desta greve dos motoristas de matérias perigosas, eu respondo que não. Prefiro andar descansado e satisfazer as minhas necessidades de consumo sempre que quero e sem incomodidade, na hora.

Se me perguntam se gosto de ver um país, ou uma região, ou um sector, parado por uma qualquer greve, eu respondo ainda que não. Acredito que os direitos de uns (cidadãos) acabam quando colidem com os direitos devidos aos outros (cidadãos). E quando reflito nesta última questão estou a pensar na saúde, na segurança, no funcionamento da vida em sociedade tal qual a entendemos nos países desenvolvidos.

Dito isto, não posso deixar de confessar a minha simpatia pelas reivindicações dos motoristas de matérias perigosas representados pelos sindicatos independentes que decretaram a greve geral por tempo indeterminado.

Primeiro, porque eles colocaram em cima da mesa reivindicações salariais que me parecem justas. Segundo, porque querem ser bons contribuintes e pagar legalmente os impostos que são devidos, sem expedientes. Depois porque desempenham a sua atividade num sector que pode pagar – no qual se ganham milhares de milhões, com o Estado sentado gulosamente na presidência do banquete da distribuição dos lucros. Quem quer conhecer substantivamente a situação só precisa de uns poucos minutos, internet e um motor de busca. Não falta informação.

Para terminar a apreciação geral: acho que o Governo não podia deixar de garantir os chamados serviços mínimos. Já a requisição civil, logo em começo de conversa, com recurso à utilização de militares e forças policiais, me parece desproporcionada.

Mas vamos ao que retiro de fundamental deste braço de ferro que espero ver terminar rapidamente com um acordo.

Há uma dimensão política do problema absolutamente clara. Governo, PS e UGT – PCP e CGTP – Bloco de Esquerda: há aqui uma santa aliança formada contra a independência sindical.

Esta greve dos motoristas de matérias perigosas é um bom exemplo de como o sistema funciona em Portugal: as duas grandes centrais sindicais são extensões do PCP e do PS. São comandadas pelos dois partidos, que assim normalizam as reivindicações de que gostam e se servem dos trabalhadores em consonância com as suas necessidades políticas. Isto passa-se em todos os sectores e os portugueses habituaram-se tanto que já não estranham. Acham normal que o secretário-geral do PS não falte à tomada de posse na UGT e que a CGTP recrute no comité central do PCP.

O acordo entre a Fectrans – sindicato afeto à CGTP que não aderiu à greve dos motoristas – e a associação de empresários do sector, a Antram, tem a ver com esta realidade. É o PCP a defender o seu reduto; a estabelecer as fronteiras entre o que está bem e o que será mau; a contar com o PS para manter a ovelhas no redil e o PS, retribuindo, a contar com os interesses do PCP para fazer política com os olhos nas eleições de 6 de outubro. Ambos têm a benção das associações patronais – é engraçado, não é? – e contam com a desistência de fazer política por parte do PSD e CDS.

Portugal não gosta mesmo de pessoas independentes.