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“A Guerra dos Tronos”: prognósticos só no final do “Jogo”

Revolucionou a televisão, dinamizou a piratariae o streaming, tem cenas que chocariam Tolkien e mais ligações familiares do que o Governo.As batalhas da série que ninguém quer perder voltam no domingo e falta pouco para todos ficarem a saber de quem será o lugar de sonho.
28 Abril 2019, 18h00

Seis episódios chegaram para a NOS, a Meo e a Nowo enviarem uma mensagem simples e direta aos clientes: não irão perder a oitava e última temporada de “A Guerra dos Tronos”, bastando-lhes pegar no telecomando e optar pelo recôndito SyFy, mais conhecido pelas séries de baixo orçamento e telefilmes com tubarões voadores. Será através desse canal que muitos portugueses verão o desfecho da mais sangrenta e fascinante saga de fantasia, assistindo na madrugada ou na noite de segunda-feira aos episódios disponibilizados pela HBO, também acessível para os clientes nacionais da Vodafone.

Quando uma série é capaz de alavancar o lançamento de um serviço de streaming que chegou a Portugal no início deste ano e de motivar um atento contra-ataque das operadoras concorrentes, receosas de perderem clientes caso não lhes pudessem oferecer esses últimos seis episódios (bem como os 67 das sete temporadas anteriores) dir-se-ia que a vitória está assegurada antes do início da batalha. Pelo menos no que toca ao sucesso de audiências de uma série que chegou a ter o estatuto de mais pirateada do mundo – “The Walking Dead” terá conseguido ultrapassá-la no ano passado – e que na temporada anterior chegou a mais de 30 milhões, nas diversas plataformas, só nos Estados Unidos, confirmando a tendência ascendente enquanto não faltam exemplos de produções a perder audiência ano após ano, definhando lentamente até ao inevitável cancelamento.

Desenvolvida pela HBO em 2010, numa adaptação dos romances “As Crónicas de Gelo e Fogo“, do excêntrico norte-americano George R. R. Martin, “A Guerra dos Tronos” teve um início conturbado ao ponto de o episódio-piloto ter de ser praticamente todo regravado, com amplas mudanças no argumento, cenários e elenco – Emilia_Clarke tornou-se sex symbol e exemplo de empoderamento feminino, mas a “mãe dos dragões” Daenerys Targaryen começou por ser interpretada pela também britânica Tamzin_Merchant -, mas não demorou a tornar-se um fenómeno.

Com a cotação do género da fantasia em alta devido ao sucesso da trilogia cinematográfica “O_Senhor dos Anéis”, a série nascida da imaginação de George R. R. Martin deixou claras as diferenças em relação à obra de J._R. R. Tolkien. “A Guerra dos Tronos”_também mistura humanos e figuras mitológicas, com a ameaça de mortos-vivos caminhantes brancos presente desde a sequência inicial, tendo-se-lhes entretanto juntado dragões e gigantes. Nunca faltaram batalhas de proporções épicas, com milhares de combatentes de cada lado, mas a intriga palaciana, a violência gráfica e o sexo explícito, muitas vezes praticado enquanto guerra por outros meios, são notas dominantes que decerto desagradariam ao pudico Tolkien.

E isto sem falar no âmago da questão._Enquanto “O Senhor dos Anéis” é uma luta entre o Bem e o Mal, “A Guerra dos Tronos” distingue-se pelos tons de cinzento nas intenções e práticas dos múltiplos personagens do enredo, ainda que tenha começado por mostrar os incestuosos Lannister a envenenarem o rei e a urdirem a captura e execução do seu conselheiro Ned Stark (Sean Bean), senhor do Norte e bússola moral do continente de Westeros.

Ter o aparente protagonista a morrer na primeira temporada só contribuiu para estabelecer outra tendência, “A Guerra dos Tronos” não é para velhos, não é para novos, e talvez nem seja para vivos. Atente-se à estatística: 186 de entre 330 personagens importantes nas sete primeiras temporadas sucumbiram, quase todas passadas a espada, envenenadas ou queimadas, numa taxa de mortalidade de 56,4%.

E quem sairá vivo?

Não espanta, por isso, que as casas de apostas londrinas paguem pouco a quem investir na morte desta ou daquela personagem. Com uma horda de caminhantes brancos, liderada pelo tenebroso Rei da Noite, prestes a enfrentar os humanos, numa batalha de Winterfell que demorou 11 semanas a gravar, em cenários da Irlanda do Norte – Malta,_Espanha e Islândia também receberam a superprodução, com um orçamento de 90 milhões de dólares (80 milhões de euros) para a derradeira temporada, numa média de 13,3 milhões de euros por episódio -, há um prenúncio de morte que a todos pode calhar.

Apesar da forte aliança entre Daenerys Targaryen, filha mais nova do rei louco morto anos antes do início da série, e Jon_Snow (Kit Harrington), o suposto filho bastardo de Ned Stark que é afinal sobrinho do decapitado e filho do irmão mais velho da “mãe dos dragões” – acabando por ceder aos encantos de quem nem imagina ser sua tia -, já nenhum deles é tido como favorito para sair vencedor de “A Guerra dos Tronos”, cumprindo a profecia do “príncipe prometido” que unirá os sete reinos. Prevalece agora o consenso de que o surpreendente triunfador será Bran_Stark (Isaac Hempstead Wright), filho clarividente de Ned Stark que logo no primeiro episódio ficou à beira da morte, e não mais deixou de estar paralisado, ao ser lançado do alto da torre onde testemunhou a forma como a rainha Cersei (Lena Headey) e o cavaleiro Jaime Lannister (Nikolaj Coster-Waldau) encaram o amor entre irmãos gémeos.

Também bem posicionado para a vitória está Tyrion_Lannister (Peter Dinkladge), o irmão dos gémeos incestuosos, discriminado pela família por ser anão, que se autodescreve como alguém que “bebe e sabe coisas” e, após ser conselheiro do sobrinho Joffrey Baratheon (Jack_Gleeson) – um monarca tão jovem quanto sádico, filho de Cersei e Jaime, como todos os seus irmãos, acaba por morrer envenenado -, escapa à morte e junta-se a Daenerys. Nem falta entre a ativa comunidade de fãs da série quem creia que também ele é mais um dos filhos secretos do rei louco, elevando as ligações familiares de “A Guerra dos Tronos” a um nível que ultrapassa qualquer Governo acusado de nepotismo.

E ainda temos Sansa Stark (Sophie Turner), livre do jugo do noivo Joffrey e do sinuoso Petyr “Littlefinger” Baelish (Aidan Gillen), e a sua irmã mais nova Arya (Maisie Williams), convertida numa das melhores praticantes da arte de matar. Bem como o bastardo_real Gandry (Joe Dempsie) e o erudito Samwell_Tarty (John Bradley), mas há quem aposte tudo no trágico Jamie – tão capaz de atirar crianças para uma morte que parecia certa como de perder a mão a defender uma donzela – ou até na pérfida Cersei, que viu morrer todos os filhos. Isto, claro, se não for o_Rei da Noite a sentar-se no_Trono de Ferro, construído com as espadas dos inimigos do primeiro rei, cuja história será contada numa nova série, prequela de “A Guerra dos Tronos”, que já está a ser desenvolvida pela HBO.

Artigo publicado na edição nº 1984, de 12 de abril, do Jornal Económico

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