Ficou célebre a frase de Lord Ismay sobre a NATO. Esta, dizia, foi criada para “manter os russos fora, os americanos por dentro e os alemães em baixo”. Era uma forma de dizer que a NATO assegurava a paz na Europa e cumpria o velho desígnio estratégico britânico de impedir o surgimento de uma potência hegemónica no Continente. Ismay estava certo: a Aliança tornou possível o mais longo período de paz desde a queda do Império Romano, há 1500 anos. É habitual atribuir-se este mérito à União Europeia, mas esta não existiria sem a NATO, a hegemonia militar americana e a ameaça soviética, que relegaram para segundo plano qualquer rivalidade que pudesse persistir entre a França e a Alemanha.

Setenta anos depois, o mundo está muito diferente. A União Soviética já não existe, Trump acelerou a tendência dos EUA para o isolacionismo e a Alemanha reunificada (apesar das reservas de Thatcher e Mitterrand, lembram-se?) é agora a maior potência europeia. Para ter futuro, a NATO precisa de se reinventar e os países europeus terão de assumir um contributo crescente para a organização.

O que nos leva a três questões que poderão ser determinantes neste processo de redefinição da Aliança.

A primeira é saber quem será o líder no campo europeu. A França ou a Alemanha? Ou as duas em conjunto, numa reedição do eixo Paris-Bona/Berlim, que assegurou o sucesso da construção europeia?

A segunda é qual será a estratégia da Aliança face à Rússia. Em Londres, Macron deu a entender que, tal como Trump, veria com bons olhos um entendimento com a Rússia, enquanto potencial parceira estratégica para conter a ascensão da China. Sem surpresa, esta posição mereceu a oposição do Reino Unido, da Alemanha (que ainda há dias expulsou dois diplomatas russos), da Polónia e de outros países de Leste, que estão demasiado perto de Moscovo.

A terceira é saber o que fará a Rússia perante uma eventual aproximação ocidental. Estará Putin disposto a deixar em paz os países vizinhos, em troca da normalização das relações com o Ocidente e do regresso da Rússia ao velho jogo de alianças, pesos e contrapesos do Velho Continente, de que está afastada desde a revolução bolchevique de 1917? Estará o Kremlin, que receia uma eventual ameaça na Sibéria, disposto a unir esforços com o Ocidente para conter o dragão chinês?

Parece que a História está mesmo de regresso à Velha Europa.