Foi recentemente publicada a lei que visa promover um maior equilíbrio de género nas empresas cotadas – a Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto –, impondo quotas mínimas de pessoas de cada sexo nos conselhos de administração e nos órgãos de fiscalização, através de um processo faseado. A quota mínima de 20% é aplicável à designação de administradores após 1 de janeiro de 2018, valendo a de 33,3% após 1 de janeiro de 2020.

A lei surge na esteira de diversas iniciativas europeias, com destaque para a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à melhoria do equilíbrio entre homens e mulheres no cargo de administrador não-executivo das empresas cotadas em bolsa.

A proposta de Diretiva europeia apenas estabelece quotas mínimas para os administradores não-executivos, abstendo-se de o fazer para os administradores executivos, “de modo a assegurar um bom equilíbrio entre a necessidade de aumentar a diversidade de género nos conselhos de administração e a necessidade de reduzir ao mínimo as interferências com a gestão quotidiana das empresas” (nas palavras da exposição de motivos da proposta de Diretiva).

A Lei n.º 62/2017 é equívoca quanto a este aspeto central. Em relação às empresas cotadas que adotam um modelo de governo dualista – ou seja, um modelo de governo com conselho de administração executivo e conselho geral e de supervisão –, a letra da lei afasta-se da proposta de Diretiva europeia, impondo quotas mínimas para os administradores executivos. Mas, relativamente às empresas cotadas que adotam um modelo de governo monista – isto é, um modelo de governo com conselho de administração e com conselho fiscal ou comissão de auditoria –, a lei aparenta conformar-se com a proposta de Diretiva europeia, não exigindo quotas mínimas para os administradores executivos.

O tratamento diferenciado das empresas cotadas, consoante adotem um modelo de governo monista ou dualista, é insustentável. A lei terá de ser interpretada de uma forma uniforme, que não discrimine as empresas cotadas em função do seu modelo de governo, valendo, sob inspiração da proposta de Diretiva europeia, apenas para os administradores não-executivos ou, em alternativa, valendo também para os administradores executivos.

O tema é delicado. Se, por um lado, no passado recente, as melhorias espontâneas no equilíbrio de géneros se têm revelado pouco expressivas, por outro lado, os regimes de quotas mínimas, sobretudo ao nível dos administradores executivos, podem perturbar a boa gestão das empresas, indispensável ao desenvolvimento económico.

Independentemente das dúvidas que este diploma legal infelizmente suscita, espera-se que as empresas cotadas portuguesas consigam adotar políticas e fazer escolhas concretas que promovam a igualdade de género, também entre os administradores executivos, e simultaneamente a boa gestão e o mérito. Este equilíbrio não só garantirá o bom governo das empresas, como reforçará o próprio movimento de promoção da igualdade de género.