O Dia Internacional das Alfândegas, celebrado anualmente em janeiro, é uma oportunidade para destacar a relevância do trabalho das autoridades alfandegárias em todo o mundo. Além das suas atividades tradicionais, como fiscalização de mercadorias e combate a crimes transfronteiriços, as alfândegas desempenham um papel fundamental na proteção de direitos de propriedade intelectual, em especial na defesa das marcas.

Em 2023[1], mais de 152 milhões de produtos contrafeitos foram detidos nas alfândegas dos Estados-membros da UE, um aumento de 77% em relação ao ano anterior. Estima-se que estes produtos tinham um valor estimado de 3,4 bilhões de euros, destacando o impacto financeiro significativo da contrafação e a importância do trabalho das autoridades alfandegárias contra produtos contrafeitos. Nesse ano, as marcas foram o principal alvo das infrações por contrafação, representando 84% do total, seguidas pelos direitos de autor (7%) e pelos designs (3%).

Em muitos países, a legislação prevê a possibilidade de um “averbamento” (ou registo) de marca junto às alfândegas. Esse procedimento formal consiste em averbar as informações relativas aos titulares do direito, licenciados, distribuidores autorizados, características de rotulagem e demais dados pertinentes para que os agentes alfandegários possam identificar com mais facilidade produtos suspeitos de serem falsificados.

Processos formais e informais

Nem todas as jurisdições oferecem um sistema de registo formal. Nesses casos, a estratégia recai sobre ações de conscientização e formação — conhecidas como mecanismos de “brand awareness”. Por meio de palestras e workshops, os titulares de marcas podem orientar os agentes alfandegários sobre detalhes técnicos dos seus produtos, mostrando como diferenciá-los de possíveis contrafações.

Quando há possibilidade de registo formal, o titular da marca deve apresentar informações relevantes que possam facilitar a identificação de produtos genuínos e a deteção de produtos falsificados. Elementos como embalagens, rótulos, hologramas, selos de autenticidade ou até mesmo recursos tecnológicos mais avançados — por exemplo, tecnologia blockchain QR codes e aplicativos específicos — podem ser fornecidos como evidência. Em alguns casos, as empresas utilizam tecnologias de rastreamento e autenticação que permitem verificar, em tempo real, se determinado produto é original ou não. Um exemplo reconhecido trata-se do grupo empresarial LVMH que utiliza a tecnologia blockchain para armazenar e verificar a autenticidade dos seus produtos.

Já nos procedimentos informais, principalmente onde não é possível efetuar um registo oficial, é fundamental estabelecer um relacionamento próximo com as autoridades alfandegárias. Por meio de sessões de capacitação e visitas técnicas, as empresas podem apresentar exemplos de embalagens originais, mostrar variações entre diferentes lotes de produção e até fornecer contatos de emergência para confirmação de autenticidade.

Tecnologias avançadas no combate à contrafação

O uso de QR codes é apenas um exemplo das diversas soluções tecnológicas adotadas pelas marcas. Outras inovações incluem etiquetas RFID (Radio-Frequency Identification), chips NFC (Near-Field Communication) e até mesmo marcas d’água digitais invisíveis ao olho humano. Abaixo listamos alguns exemplos famosos:

  • Pfizer – utiliza etiquetas RFID (Radio Frequency Identification) em medicamentos essenciais para garantir a autenticidade e a rastreabilidade ao longo da cadeia de distribuição.
  • Rolex – Adiciona um holograma exclusivo na parte traseira dos relógios. Este holograma é difícil de reproduzir e funciona como um selo de autenticidade.
  • Nike – Implementou QR codes exclusivos em algumas linhas de ténis. Estes códigos podem ser verificados pelos consumidores através de uma aplicação oficial da marca para garantir que o produto não é contrafeito.

Todas estas ferramentas facilitam o trabalho dos agentes alfandegários e dos próprios consumidores na hora de verificar se um produto é legítimo.

Além disso, algumas empresas investem em plataformas de monitoramento online que rastreiam, em tempo real, a distribuição dos seus produtos. Quando um envio suspeito é identificado, a informação pode ser rapidamente compartilhada com as autoridades alfandegárias, agilizando a apreensão de mercadorias ilegais.

A União Europeia e a centralização do processo

Em 2023[2], a Itália liderou as apreensões de produtos contrafeitos, representando mais de 74% do volume total, seguida por França, Roménia e Espanha. A União Europeia vem dando passos significativos para unificar a proteção de marcas em todo o bloco. Por meio do IP Enforcement Portal as empresas podem protocolar um único pedido de intervenção que abrange múltiplos Estados-membros. Este sistema centralizado torna o processo mais eficiente e reduz a burocracia para as marcas que atuam em diferentes territórios da UE.

Uma das grandes vantagens deste portal é que o registo das informações do produto e dos respetivos direitos na plataforma não acarreta custos oficiais e, através de um único pedido, consegue-se alertar as autoridades alfandegárias respetivas.

Cumpre-nos realçar o papel estratégico que as alfândegas exercem na defesa dos direitos de propriedade intelectual e, consequentemente, na proteção de marcas. Tanto em países onde existe a possibilidade de averbamento formal quanto naqueles em que se adotam formações e parcerias informais, a colaboração entre os titulares dos direitos e as autoridades alfandegárias é essencial para combater a entrada de produtos contrafeitos no mercado.

 

[1] Relatório publicado pelo IPIUE – “EU enforcement of intellectual property rights: results at the EU border and  in the EU internal market 2023”
[2]  Relatório publicado pelo IPIUE – “EU enforcement of intellectual property rights: results at the EU border and  in the EU internal market 2023”