Depois da tempestade vem a bonança, vale para as turbulências nos sistemas bancários americano e europeu de há 15 dias. Depois das perdas de dois dígitos em 2022 em Wall Street, 2023 começou bem: a inflação cedia e as expectativas de subidas da taxa de juro pela Reserva Federal dos EUA (Fed) moderavam-se. Foi sinal a inversão da curva de rendimento das obrigações do Tesouro: no fim da semana passada a taxa de juro das obrigações a dois anos era 4%, enquanto a das a 10 anos era 3,48%, mais de 50 pontos de diferença.
O balanço da Fed – títulos do Tesouro e Mortgage Backed Securities detidos pelo banco central – tinha diminuído um milhão de milhões de dólares em cerca de um ano, mas ainda era quase oito milhões de milhões; a coisa estava para durar, e para vender é preciso pagar mais (elevar a taxa). Mas que o mercado estava mais otimista é claro: a diferença estava em mais de 100 pontos há um mês. A antecipação do mercado é agora que a 2 de maio teremos o último aumento, de 25 pontos (a FEDwatch Tool dá-lhe 57,7% de probabilidade, contra 42,3% de não variar).
Percebe-se assim que o mercado tenha ultrapassado os episódios recentes do Silicon Valley Bank e do Signature Bank – não constituíam um risco sistémico, apenas dois casos em que, como disse Michael Barr no seu testemunho no Congresso, a gestão do banco falhou, os supervisores falharam e o sistema regulatório falhou.
À partida, uma má gestão de riscos em relação a clientes que não tinham os seus depósitos seguros – o que provocou a bank run que levou os dois bancos ao tapete, por razões diferentes, com exposições diferentes. Não é, portanto, de estranhar que o mercado tenha acabado por recuperar: o NASDAQ acabou o trimestre a subir 16,8%, o S&P 500 cresceu 7%. Note-se que este episódio fez que o risco de recessão levaria a Fed manter as taxas de juro na reunião de 22 de março, mas se o tivesse feito teria criado dúvidas sobre a solidez da retoma, o que seria contraproducente – bem fizeram Powell & Cia.
Na Europa, a situação é diferente, com consequências inesperadas: caiu o Credit Suisse num país que fez da segurança do seu sistema bancário uma imagem de marca. Os danos reputacionais são terríveis, ninguém voltará a olhar para os bancos suíços da mesma forma. Mas o panorama económico é desigual – por exemplo, a taxa de inflação na Alemanha é ainda 7,4%, e no Reino Unido subiu em fevereiro (para 10,4%) –, a união bancária está por fazer e o grau de exposição é maior: os empréstimos ao setor privado tinham em 2019 a dimensão do PIB, enquanto nos EUA eram metade.
Ao mesmo tempo, a Alemanha tem as maiores greves em décadas e a situação social em França é delicada, o que torna complexo o desenho da política monetária. E acabaram as taxas de juro próximas de zero, pois o principal fator de desinflação das últimas décadas – a globalização – acabou, como mostra o recente corte na oferta de petróleo decidido pela OPEP, o último passo no caminho para um mundo multipolar.