Os custos de termos construído uma economia que vive da incessante oferta e procura, num ritmo esmagador que não encoraja paragens, fizeram-se sentir de uma forma excruciante em plena pandemia, a qual obrigou grande parte da população trabalhadora a um confinamento obrigatório.

Empresas com uma invejável saúde financeira sofreram um retrocesso que as leva novamente ao aperto de cinto quando nada o fazia prever, e empresas em situação já periclitante veem-se irremediavelmente a ir ao fundo.

Os números da realidade portuguesa são impressionantes: até 14 de abril mais de um quarto da população ativa encontrava-se em lay-off. Como é que uma economia sobrevive a um golpe destes? Dois meses de paragem traduzem-se em lenta agonia para muitas pequenas e médias empresas, com o acumular de dívidas e pagamentos ao Estado.

Além disso, num mercado de trabalho como o português, onde é notório o elevado nível de precariedade dos vínculos laborais em muitos setores ligados à cultura, turismo, restauração, há ainda todo um conjunto de atividades que orbitam em torno destes setores duramente afetados pelo confinamento e cujos trabalhadores veem os seus rendimentos cessar de um dia para o outro.

A resposta do Estado está a ser fundamentalmente suportada pela Segurança Social e pelos bancos, que têm visto um aumento de burocracias por parte das Sociedades de Garantia Mútua, atrasando de forma obscena as linhas de crédito destinadas a apoiar empresas.

Por mais que sejam os sinais de boa-fé e empenho por parte do Governo de António Costa em proteger os rendimentos e empregos, têm faltado soluções muito mais ousadas para esta hemorragia. Iniciado o período de desconfinamento, o consumo ainda é demasiado reduzido para cobrir os elevados prejuízos e tão cedo não irá regressar aos níveis pré-Covid, visto que ainda serão necessárias medidas de restrição por largos meses para se evitar uma segunda vaga da doença.

O programa de relançamento da economia não pode assentar apenas em fundos europeus e na intervenção bancária. Tal como não pode colocar o ónus naqueles que mais sofreram e irão sofrer, correndo o risco de gerar novas colisões e fraturas políticas à esquerda que serão ainda mais agravadas com a emergência do populismo-nacionalismo em Portugal.

Por mais populares que sejam as sondagens para o Governo, de agora em diante o caminho de António Costa é um caminho de gelo fino e pode quebrar-se facilmente sob o peso de uma visão demasiado tecnocrata e pouco solidária, como sucedeu durante os anos da troika.

Um plano nacional está também dependente do ‘plano europeu’, e nesse campo continua a indefinição e falta de consenso, sendo que muitas vezes as incompatibilidades entre as lideranças europeias têm sido contornadas com recurso ao BCE, que tem tido o papel de manter o euro à tona. Mas mesmo o BCE só pode ir até um certo ponto.

Como cidadãos europeus, temos o direito de exigir verdadeiras mudanças e de abrir caminho para um novo mundo pós-pandemia que não se transforme num regresso à antiga normalidade – a qual não era saudável nem a desejada. Da mesma forma que não podemos permitir que as nossas lideranças desperdicem esta oportunidade de ouro para concretizar novas visões para o futuro.