O que temos em Portugal, desde 1976, é a reedição do velho rotativismo partidário da monarquia liberal, que vigorou na segunda metade do século XIX e início do século XX. Durante grande parte desse período, os partidos Progressista (esquerda) e Regenerador (direita) revezaram-se no poder.

O rotativismo partidário regressou, em 1976, a Portugal. A partir dessa data, PS e PSD têm ocupado, alternadamente, o poder. É impressionante verificar que os mapas eleitorais pouco mudaram em mais de um século. O PS é maioritário onde o Partido Progressista o foi na sua época. Por seu lado, o PSD é predominante nos tradicionais feudos eleitorais do Partido Regenerador.

Ao longo destas cinco décadas, a esquerda foi quase sempre maioritária no país. O que equilibrou as coisas foi o facto de o PS não poder contar, ao longo das primeiras quatro décadas do atual regime democrático, com as outras forças parlamentares de esquerda (atualmente o BE e o PCP). Pelo contrário, o PSD pôde, quase sempre, contar com o apoio do CDS-PP, o outro partido parlamentar de direita. Beneficiou ainda da menor fragmentação partidária do voto de centro-direita, que no essencial concentrou historicamente o seu voto no PSD e no CDS-PP.

Mas as coisas mudaram, bruscamente, nas eleições legislativas nacionais de 2015. Nesse ano, apesar de derrotado eleitoralmente pela coligação PSD/CDS-PP, António Costa conseguiu subir ao poder com o apoio da CDU e do BE. Pela primeira vez, no âmbito do atual período democrático, a esquerda uniu forças para afastar a direita do poder. Tudo isto significou uma autêntica revolução no velho sistema partidário da III República, um dos mais estáticos da Europa.

A seguir, nas eleições legislativas de 2022, António Costa aproveitou os clamorosos erros políticos do Bloco de Esquerda e do PCP e logrou a atual maioria absoluta muito à custa da concentração do voto da esquerda no PS, graças ao velho número da vitimização que encenou e à utilização do CHEGA como ameaça à hegemonia da esquerda e do próprio regime.  As eleições de 2022 ditaram o desaparecimento do CDS-PP da Assembleia da República e o crescimento exponencial do CHEGA e da Iniciativa Liberal.

Em síntese, o sistema político português sofreu, nos últimos anos, duas alterações fundamentais: o fim das muralhas de Jericó à esquerda e a balcanização da direita portuguesa. Tudo se alterou. Os equilíbrios são outros.  A questão que se coloca agora é a seguinte: pode o PSD superar sozinho o conjunto da esquerda? A resposta lógica e honesta é não. Não é, nas atuais circunstâncias, possível.

O que é que nos ensinou a experiência açoriana a este respeito? Em 2020, o conjunto de partidos de direita e de centro-direita – PSD, CDS-PP, PPM, CHEGA e Iniciativa Liberal – superaram o PS e o BE no Parlamento dos Açores. Surgiu, assim, a oportunidade de pôr fim a um governo socialista, que se eternizava no poder desde 1996. A oportunidade não foi desperdiçada.

A fórmula açoriana tem resultado. O PSD, o CDS-PP e o PPM têm uma longa História em comum. A primeira coligação entre os três partidos data de 1979. Foi a célebre AD, liderada por Francisco Sá Carneiro. A proximidade ideológica entre os três partidos e o longo percurso que têm em comum tem vindo a permitir à coligação açoriana uma coesão parlamentar e de Governo absolutamente notáveis.

A Iniciativa Liberal e o CHEGA não integram o Governo Regional. Realizaram, apenas, acordos de incidência parlamentar. Para marcarem terreno, estes dois partidos têm vindo a protagonizar, de forma cíclica, algumas divergências, mais retóricas que outra coisa, com a coligação. Mas sem efeitos concretos. Para já, o Governo Regional da coligação viu aprovadas, até ao momento, 98% das iniciativas que apresentou no Parlamento dos Açores e três dos quatro Orçamentos Regionais que apresentará até ao final da legislatura.

O PSD concorrerá coligado com o CDS-PP nas próximas eleições regionais da Madeira, que se realizarão ainda este ano. O mesmo sucederá nos Açores, em 2024, mas aqui também com o PPM, que integra o atual Governo dos Açores. É natural que assim seja. Os três partidos partilham responsabilidades governativas e é natural que honrem os compromissos assumidos e se apresentem juntos ao eleitorado.

Nos Açores, o PSD tornou-se o partido central do sistema partidário. Negoceia e faz acordos, de governo ou meramente de incidência parlamentar, com seis dos oito partidos representados no Parlamento Regional (para além dos partidos da direita, também com o PAN). Esta centralidade e capacidade de diálogo tem vindo a permitir-lhe manter-se no poder, apesar de contar com menos quatro deputados que o PS.

O PSD deve procurar essa mesma centralidade no sistema político nacional. Regressar ao poder implica ganhar ao PS, mas não só.  É necessário superar a conjugação dos mandatos que vierem a obter o PS, o PCP, o Bloco de Esquerda e o Livre. Não é fácil, mas a outra opção é permitir a eternização do PS, que está absolutamente esgotado e repleto de vícios, no poder. Montenegro pode sempre perguntar a José Manuel Bolieiro como é que se faz.