No momento em que escrevo, logo no início da semana, a agenda está marcada pelo anúncio da intenção de alguns dos clubes europeus mais notórios em constituírem uma Super Liga Europeia. Como que em modo de circuito fechado. Um espaço de acesso restricto apenas a uma elite. Percebe-se a intenção de concentrar em poucos clubes os direitos televisivos mais apetecidos, aumentando o número e a constância de jogos entre alegadas super equipas.

Sem correr os riscos de uma eliminação aos pés de um qualquer Ajax, Benfica, Olympiacos, Porto ou Sporting.
Uma espécie de liga fechada, sem subidas nem descidas para um grupo restricto, em linha com modelos oriundos do desporto norte-americano.

Talvez tenha sido apenas um balão de ensaio para forçar a UEFA a uma Liga dos Campeões que, no essencial, assegure o objectivo dos promotores: aumentar a sua exposição e tempo de competição, com o brutal acréscimo de receitas a reverterem para um punhado, e apenas um punhado, de clubes.

Provavelmente as alegadas super equipas não querem o alargamento que a UEFA se preparava para fazer no formato da Liga dos Campeões, na medida em que dividirá a receita por mais clubes e países. Como é justo que aconteça. No fundo, incomoda-os uma Liga dos Campeões mais centrada no mérito e êxito desportivo e não na maximização pura e dura dos lucros.

É claro que as alegadas super equipas procuram disfarçar um pouco as suas pretensões. Sem sucesso, refira-se. A verdade crua é clara e a intenção dos promotores da Super Liga Europeia ilustra como a ganância pode ser o valor supremo da vida. Ignorando que o futebol, para que existam um punhado de equipas globais, vive de milhões de praticantes, dirigentes e clubes anónimos. E que a padronização das regras de jogo, a existência de campeonatos regionais e nacionais, e a centralização de direitos televisivos foram os elementos da tríade que permitiram à Europa dominar este desporto.

Eis o futebol como espelho do que se passa em muitos outros sectores das nossas economias e sociedades. A ganância de uns poucos, que se querem aboletar do que a muitos diz respeito, parece, para já, ter esbarrado na forte oposição da UEFA, das Federações Nacionais e dos jogadores profissionais.

Mas não nos iludamos. A procissão, nesta pretensão egoísta de a poucos querer destinar o que a muitos deve pertencer, ainda só vai no adro. Bancos de investimento norte-americanos, fundos não regulados, entre outros sujeitos habituais, juntar-se-ão a uma profusão de protagonistas jurídicos que procurarão argumentar que a UEFA (e as Federações Nacionais) abusa de sua posição dominante e viola os tratados europeus. E relembre-se que a Comissão Europeia (e já agora o TJUE) tem sido da opinião que o futebol é uma mera actividade económica, devendo ser regido como tal no enquadramento da política de concorrência da União.